quinta-feira, março 31, 2011

Opinião: "Como a crise política pode afectar o País e a sua carteira"

"Demissão do Governo não arrastará o PSI 20 para o abismo. O mesmo não deverá suceder com os fundos ricos em obrigações portuguesas. A semana que passou não se afastou muito da tendência normal dos acontecimentos dos últimos meses: o Sporting voltou a não marcar golos na Liga de futebol, o professor Marcelo Rebelo de Sousa discutiu mais uma vez o estado do país no Jornal Nacional da TVI de domingo, as ‘yields' das obrigações do Tesouro voltaram a bater novos máximos e a dívida pública não parou de crescer a um ritmo de 2 milhões de euros por hora. A grande novidade, ou talvez não, foi o anúncio da demissão do Governo na quarta-feira. Do ponto de vista da análise política, a renúncia de José Sócrates ao cargo de primeiro-ministro pode ter várias leituras mas do óculo económico e financeiro está longe de ser uma catástrofe. Pelo menos do ponto de vista dos mercados que, na quinta-feira, um dia depois de o pacote de medidas inseridas no PEC IV ter sido rejeitado pelo Parlamento e o primeiro-ministro ter apresentado a demissão do Governo, somou uma sessão de ganhos que prolongou-se até ao final da semana. Nem mesmo o corte de ‘rating' da dívida portuguesa das agências de notação financeira Fitch e Standard & Poor's na quinta-feira, abalaram o movimento da bolsa portuguesa. "O mercado não reage obrigatoriamente mal a más notícias. O mercado reage é muito mal à incerteza", justifica Ricardo Valente, professor na EGP- University of Porto Business School, salientando ainda para o facto de "a clarificação política e a legitimidade política serem fundamentais para o mercado". A última crise política em Portugal revela isso mesmo: desde a demissão de Santana Lopes, a 30 de Novembro de 2004, até à realização das eleições legislativas, a 20 de Fevereiro de 2005, o desempenho do principal índice accionista da bolsa portuguesa não diferiu muito da ‘performance' dos seus pares europeus. "Contudo, na actual conjuntura, o cenário mais provável é a continuação da tendência de ‘underperformance' do PSI 20", refere Angelo Mea, analista do BPI, no "Diário de Bolsa" do banco de quinta-feira. Os investidores podem ser impiedosos a penalizarem o preço de um activo. É isso que tem sucedido com os títulos de dívida soberana de alguns países da zona euro, onde Portugal se inclui, desde 2010, e o que deverá acontecer sobre alguns títulos da praça nacional, na eventualidade de Portugal recorrer a ajuda externa e ser obrigado a aplicar uma série de novas medidas de austeridade mais severas. Neste cenário, as indústrias "mais dependentes do sector público como é a construção, as auto-estradas (Brisa), as acções de telecomunicações", e ainda as empresas com elevados níveis de alavancagem deverão ser as mais penalizadas, referem os especialistas do BPI no relatório "Iberian Daily" de 24 de Março de 2011.

Para o departamento de ‘research' do banco, também as companhias regulamentadas, como a EDP e a REN, podem ser apostas mais arriscadas na eventualidade da ocorrência de pressões de cortes nos salários dos trabalhadores (decorrente da entrada do FMI no país) que propiciará uma redução dos custos da população em geral, afectando assim os lucros das empresas de serviços públicos (‘utilities') e relacionadas com o consumo de combustíveis. Do ponto de vista do sector financeiro, o BPI refere que dificilmente a banca passará impune a mais constrangimentos decorrente de um pedido de ajuda externa, dado que "os bancos são naturalmente afectados por este evento, dado o processo em curso de melhoramento dos rácios de capital e de alavancagem", lê-se no "Iberian Daily" de quinta-feira. Duarte Caldas, analista da IG Markets, expõe essas fragilidades ao lembrar que "a banca está muito dependente das operações do BCE, e mais ou menos trimestre essas operações vão terminar". Este é também um sentimento partilhado pelos analistas do UBS, que sugerem estar "relativamente cautelosos com os bancos, a Portugal Telecom e a EDP". Segundo uma nota de ‘research' do banco suíço enviado a semana passada para os seus clientes, estas companhias estão "vulneráveis e relativamente caras face às suas concorrentes europeias."Para os investidores que queiram continuar no mercado, o banco suíço recomenda a Brisa, Sonae e Zon por estarem a cotar a "desconto, com uma avaliação barata". Além disso, os especialistas do UBS escrevem que vêm "a possibilidade de se gerar um bom valor na Portucel, Mota-Engil, EDP Renováveis e Sonaecom". Já os analistas do BPI não têm dúvidas em apontar "as acções com maior exposição ao mercado internacional, como a Galp, Jerónimo Martins, Portucel ou Cimpor, como podendo poderão ser as empresas menos afectadas e, consequentemente, "serem uma boa alternativa para cobrir o risco dos eventos presentes". Para Duarte Caldas, a receita é simples: "As pessoas devem investir em empresas que têm estado a registar um bom desempenho desde o início do ano: Portucel, Galp, Jerónimo Martins", porque "o que subiu vai continuar a subir", conclui o analista" (texto do jornalista do Económico, Luís Leitão, com a devida vénia)

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