terça-feira, agosto 28, 2012

Opinião: "Os trabalhos (mais difíceis) da troika"

"A equipa da troika inicia hoje a quinta e mais difícil avaliação ao programa português de ajustamento. Será o exame que envolve as decisões mais difíceis, pelos riscos políticos e económicos que envolve. Em meados de Setembro, poderemos receber novas notícias de mais medidas de austeridade ainda para este ano. A dimensão depende do que entretanto se passar com a Grécia. A equipa da troika inicia hoje a quinta e mais difícil avaliação ao programa português de ajustamento. Será o exame que envolve as decisões mais difíceis, pelos riscos políticos e económicos que envolve. Em meados de Setembro, poderemos receber novas notícias de mais medidas de austeridade ainda para este ano. A dimensão depende do que entretanto se passar com a Grécia. Vamos aos factos. Portugal não vai conseguir cumprir o défice público projectado para este ano, de 4,5% do PIB, sem mais medidas. A derrapagem será, no mínimo, da ordem de 1% do PIB, ou seja, cerca de 1.700 milhões de euros. O "buraco" é totalmente explicado pela receita fiscal, nomeadamente de IVA, inferior à prevista. Na última avaliação, quando já se detectavam riscos de derrapagem orçamental, o líder da missão do FMI Abebe Selassie manifestou-se favorável à flexibilização do objectivo para o défice público desde que a derrapagem fosse explicada pelos estabilizadores automáticos, isto é, por uma quebra da actividade económica superior à prevista. A economia não afundou mais que o previsto, mas a estrutura do crescimento, com menos consumo privado e mais exportações, jogou contra a receita fiscal na última avaliação.
Deixados os factos vamos às expectativas, condicionalismos e estratégias de cada uma das partes.
O governo espera que a troika leve em consideração esta alteração de perfil na evolução da economia, menos amigável para a receita fiscal. Vítor Gaspar está, desde Junho, a preparar os avaliadores, a opinião pública e os investidores para a elevada probabilidade de não se cumprir o objectivo do défice público. Contou com o apoio do
Eurogrupo que recomendou à troika que trabalhasse em conjunto com o governo de Lisboa. E a adopção ou não de mais medidas depende do que for decidido durante esta avaliação, numa estratégia diametralmente oposta à seguida há um ano, quando o governo se antecipou à troika. Foi a 30 de Junho de 2011 que, perante a impossibilidade de respeitar o objectivo do défice, Pedro Passos Coelho anunciou no Parlamento o imposto extraordinário de cerca de metade do subsídio de Natal. Para o Governo, na altura, esta era uma forma de mostrar à troika que Portugal não apresentava problemas, dava de imediato soluções. Uma estratégia que não vai seguir agora, contando com a colaboração da troika para encontrar uma solução para a derrapagem deste ano. Ou seja, a solução já não é tão fácil este ano.
Do lado da troika, a atitude que podemos encontrar é muito diferente, caso se trate do FMI ou da
Comissão Europeia. O Fundo é muito mais flexível e, se dependesse apenas dele, não existiriam mais medidas de austeridade e o objectivo do défice público seria totalmente flexibilizado. O mesmo já não se pode dizer em relação à Comissão Europeia. A equipa europeia tem-se mostrado muito mais rígida e está neste momento politicamente condicionada pelo que se passa na Grécia e pela opinião pública do norte da Europa. Como explicar que se flexibiliza os objectivos para Portugal e não se faz o mesmo para os gregos? Há, claro, argumentos que favorecem um tratamento diferenciado de Portugal: o governo de Lisboa está a cumprir a maioria das medidas consagradas no Memorando, o que não acontece com a Grécia; as taxas de juro da dívida pública portuguesa não subiram com o anúncio da derrapagem orçamental; os analistas internacionais têm-se manifestado mais favoráveis à flexibilização do défice público do que a mais austeridade e, finalmente, viabilizar a subida do défice este ano - ou seja, dar mais tempo - não exige mais dinheiro da troika. O caos em que está a Zona Euro, com a Espanha e a Itália a enfrentarem também o espectro da ajuda externa é mais um factor favorável a Portugal que deixou de ter sobre si os holofotes dos media e dos investidores internacionais. As decisões vão começar a ser tomadas hoje. Mas dada a dimensão da derrapagem e os condicionalismos que a Zona Euro enfrenta, o cenário mais provável é o de metade para cada lado: mais austeridade ainda este ano com alguma flexibilização do objectivo do défice público" (texto de Helena Garrido no Jornal de Negócios, com a devida vénia)

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