quarta-feira, janeiro 30, 2013

Opinião: "Turbulências no PS"

"A instabilidade no PS não surpreende. Tenho hoje a clara sensação de que a liderança de Seguro falhou e que sectores do PS que eventualmente não estiveram com a sua eleição, estão a congregar esforços para tentarem uma alternativa. Ou seja, o PS depois da terrível herança deixada por Sócrates - da qual a falência do país, o pedido de auxílio externo e a negociação do memorando de entendimento com a "troika" são as bandeiras mais conhecidas - pretende entrar numa outra fase, provavelmente espicaçado pela ideia de que uma crise política em Portugal será inevitável. E que, por isso, teremos eleições antecipadas ainda este ano. Curioso o facto do antigo braço direito de Sócrates, Silva Pereira, ter reclamado a antecipação do Congresso socialista e admitido que neste momento o PS não está preparado para “se assumir como alternativa no poder” facto que deixou os seus correligionários estarrecidos.
Penso que esse desejado desfecho de crise política, a materializar-se, nunca será, tal como referiu Passos Coelho, nem por mérito da oposição, que continua a ser mais do mesmo e que, muito sinceramente, não esboçou até este momento uma alternativa consistente e credível, nem sequer por demérito da coligação claramente enfraquecida e assente numa indisfarçável desconfiança mútua, mas antes por mérito e por pressão da rua, pela insatisfação popular, pela revolta, pela manifestações, pelo empobrecimento galopante, pelo desemprego gritante, pelo roubo continuado de salários, reformas e pensões, pela transferência de encargos do Estado para as pessoas ou as empresas, apesar de eles estarem definidos constitucionalmente, enfim pela exigência de mudança.
O problema é que a dimensão da ânsia de regresso ao poder por parte do PS, tal como o desejo da oposição de que esta coligação se afunde e o governo caia, é exatamente a mesma, senão menor, que o sentimento de sobrevivência que a coligação no poder, apesar de tudo, transmite, provavelmente porque o PSD sabe que perderá eleições – com tudo o que isso implicará em termos de instabilidade interna e de afastamento de Passos – como o CDS percebe que corre o risco de uma pulverização eleitoral durante alguns anos, com tudo o que de negativo daí decorre.
PSD e CDS precisam de ganhar tempo até 2015, precisam de suavizar a austeridade imposta, precisam de ter condições – daí a manipulação feita à volta do “regresso” aos mercados, em meu entender uma manobra de propaganda para desviar a atenção dos cidadãos do essencial e do que está realmente em causa, como é o caso da brutal carga fiscal em vigor este ano – para devolverem aos cidadãos o que lhes foi roubado neste dois anos (salários, reformas, pensões), precisam de reduzir impostos, precisam de criar mais empregos e de dar respostas aos jovens obrigados a emigrar para desespero das suas famílias, etc. Para isso é necessário mais tempo.
Neste contexto de autêntica paz podre, é muito fácil o discurso demagógico da oposição, particularmente do PS, de estar sistematicamente contra tudo (só porque está na oposição?!) de contrariar tudo aquilo que o poder pretende executar, sobretudo se isso prejudica as pessoas e as empresas, mas sem nunca ousar apresentar alternativas concretas. O PS confunde-se no seu procedimento político, banalizado e disperso, com um Bloco de Esquerda onde ninguém sabe quem lidera quem, e com um PCP que apesar do sei discurso coerente, estruturado e repetido, não consegue mais do que isso, apesar da fortíssima influência que detém no movimento sindical, concretamente na Intersindical.
Aliás, não deixa de ser caricato que, de repente, a oposição a este governo pareça estar nas mãos dos sindicatos, melhor dizendo na Intersindical do PCP. Com a UGT amarrada de curto devido ao estranho acordo de concertação social e mais interessada em alinhar pela estratégia socialista do ganhar tempo (ou do "esperar para ver"), é um facto que os sindicalistas ligados ao PCP acabam por ter em mãos a responsabilidade de conduzir a oposição a este governo. O que coloca desde logo vários outros problemas, a começar pela eficácia dessas iniciativas, pela própria legitimidade política dessa oposição, pela capacidade de mobilização (apesar do aluguer de centenas de autocarros para manifestações sindicais, muitas delas com hora de início e de encerramento!) e a sua representatividade popular, etc. Até os cânticos dessas manifestações sindicais se confundem com as palavras de ordem do PCP…
De concreto, o que é que resulta dessa oposição social com o PCP a pretender chamar a si os louros dessas iniciativas sindicais? Será que o PCP consegue encontrar no seio do movimento sindical a força política que não tem nem em termos eleitorais, nem no debate político quotidiano propriamente dito?
É aqui que entra o PS, melhor dizendo, que se começam a movimentar alguns setores socialistas, incluindo os herdeiros do "socratismo" que apesar da facilidade com que penetram na comunicação social - vantagens ténues de um passado recente?! – penso que não ousarão avançar com nenhuma candidatura própria. Seria caótica, pois as bases do PS continuam a responsabilizar Sócrates pelo estado em que o partido e o país se encontram. E quanto a isso não tenhamos dúvidas. Aliás esta boa-vida de uma milionária estadia em Paris, a pretexto de estudar filosofia (!), para onde fugiu depois da derrota eleitoral de Junho de 2011, apenas tem reforçar essa contestação socialista contra o seu antigo líder.
Vai daí, a única alternativa que resta à corrente socialista identificada com o "socratismo" - considerando o falhanço e a ineficácia da liderança de Seguro - será a de apoiar uma alternativa publicamente conhecida, plausível, consistente, congregadora internamente e com força eleitoral. António Costa, edil de Lisboa, parece ser uma personalidade que se encaixa perfeitamente nesse perfil e com ele provavelmente acenderá uma nova vaga de dirigentes experimentados, entre os quais, e por exemplo, Carlos César, antigo líder do governo regional açoriano. Não tenho dúvida que numa futura mudança política no PS, César terá um protagonismo importante.
Ora esta questão coloca aspetos temporais e políticos que não podem ser subestimados. Desde logo as "diretas" e a dúvida quanto à possibilidade da liderança de Seguro ter conseguido controlar as estruturas concelhias, apostando nelas como alicerces de uma vitória - o exemplo recente das "diretas" no PSD da Madeira desmistificou muita coisa sobre o pretenso "domínio" das máquinas partidárias sobre a consciência e a liberdade de escolha dos militantes dos partidos.
Uma coisa é certa: a instabilidade no PS, corporizada na exigência da antecipação mais que provável das "diretas" e do Congresso, resulta da pressão política que a oposição está sujeita, quer pela proximidade das autárquicas, quer pelos resultados pouco estimulantes das sondagens - apesar do PS surgir em todas elas como o partido mais votado mas obrigado a alianças parlamentares - quer pela eventualidade de uma crise política no país, apesar de me parecer haver, no que a esta questão diz respeito, um óbvio desleixo (do PS e demais oposição) quanto à capacidade de resistência da atual coligação (a fome de poder e a ânsia da sobrevivência por vezes geram reviravoltas inesperadas e "milagres" impensáveis...) no combate a essa crise política.
Quer isto dizer que o PS poderá estar a correr um risco político perigoso e a cometer um erro estratégico, tudo por causa da fome de regresso ao poder, ao antecipar o congresso e eventualmente eleger outra liderança, ignorando que corre o risco da Legislatura cumprir o seu período de 4 anos, o que remete eleições legislativas para 2015" (JM)