sexta-feira, maio 31, 2013

Opinião: "Eleições (II)"



"No caso da Madeira, sujeita por um lado às medidas nacionais e por outro aos efeitos do programa de ajustamento financeiro, serão também as primeiras eleições depois das regionais de Outubro de 2011 e da austeridade implementada a partir de Março de 2012, após a assinatura do memorando de entendimento em Janeiro desse mesmo ano. Não vale a pena andarmos a tentar ignorar esta realidade ou a assobiar para o lado, deixando para depois das eleições o ajuste de contas interno (nos partidos) ou a responsabilização pelo desaire, seja do que for e de quem for. É melhor assumir a realidade, ser verdadeiro, ser honesto, ser sincero e enfrentar o eleitorado desanimado, frustrado, desmotivado, deprimido, olhando-o de frente, olhos nos olhos. A austeridade, qualquer que ela seja, o desemprego, que no caso da Madeira é uma tremenda preocupação, terão sempre influência nas opções eleitorais dos cidadãos, sobretudo no chamado eleitorado flutuante, que não se vinca a partidos com carácter permanente antes decide como vota em cada momento. A tudo isto junta-se o risco de uma abstenção mais elevada e que nas eleições autárquicas foi sempre um dos principais problemas.
Mas há ainda um outro dilema, porventura o mais complicado, e que tem a ver com, o facto de que os eleitores percebem que, ao propiciarem uma vitória eleitoral aos dois partidos da coligação nacional que responsabilizam pela presente situação, acabam indirectamente, por legitimar um poder e uma actividade governativa absolutamente criminosa, abjecta e desprezível que tanto contestam, que tantos protestos motiva, que tantos dramas sociais, mormente em termos da proliferação da pobreza, da exclusão social e do desemprego para níveis nunca antes vistos, originou e que se limita a acelerar deliberadamente o empobrecimento do país e das famílias, retirando-lhes qualquer rendimento disponível, por mais insignificante que seja.
Isto leva-me a reforçar a ideia de que a campanha eleitoral - que este ano exige, mais do que nunca, verdade, pragmatismo e humildade - tem que centrar-se nas prioridades da sociedade na presente conjuntura de crise e austeridade, concretamente os problemas sociais dramáticos e a necessidade das autarquias terem condições logísticas e recursos financeiros para intervirem. Estamos a falar de uma campanha eleitoral, quiçá a mais humanizada de todas, sem espalhafatos, que não se compatibiliza com gastos elevados ou com encenações complementares que tendo feito sentido, e que porventura fariam sentido numa outra conjuntura social, económica e política, deixaram de o ter nos momento presente face aa dimensão dos dramas sociais. Uma campanha na qual os candidatos, mais do que nunca terão que dar a cara, que se mostrar, que ganhar respeitabilidade e gerar confiança, privilegiando o contacto directo, o tal olhar olhos-nos-olhos com as pessoas de que falava anteriormente.
Sabemos que o PSD nacional é hoje um partido sem motivação, sem espaço, sem protagonismo, entregue a uma pequena "elite" de medíocres, saloios e iluminados, que consegue manter reféns as estruturas partidárias locais, ou por via da manipulação com as candidaturas autárquicas, ou recorrendo à mentira, ao embuste - o maior deles foi consubstanciado quando esta gentinha ganhou as directas - ou mesmo à pressão e à ameaça. Estamos a falar de uma cambada de oportunistas que em termos de ética, de rigor e de princípios e valores, é tão ou mais vazia que o próprio vazio em si mesmo.
Mas o PSD tem outro problema adicional, que hipocritamente desvaloriza, mas que será determinante para o seu futuro e desta corja que nos governa. Problema que decorre do facto do PSD estar a perder uma significativa parcela da sua base social e eleitoral de apoio, como consequência das medidas de austeridade tomadas ao longo dos anos e que visaram muito acentuadamente duas parcelas decisivas dessa sustentação eleitoral dos social-democratas. Falo dos funcionários públicos e dos reformados e pensionistas. Estamos a falar de um universo global da ordem, dos 3,5 a 4 milhões de pessoas, cerca de 50 por cento dos eleitores inscritos em cadernos eleitorais.
Para além de todos estes obstáculos que se colocam à maioria no poder, proliferam as chamadas candidaturas independentes, as quais, em minha opinião, mais do que terem condições para ganhar, acabarão por condicionar o apuramento de mandatos por via do método de Hondt, o que pode ser problemático para PSD e CDS. Por falar em CDS, parece-me óbvio que Paulo Portas e a nomenclatura dirigente dos centristas temem perder influência, a pouca influência autárquica de hoje detêm, sendo por isso provável que a coligação comece a tremer perigosa e gravemente, porque passamos a falar de um desaire eleitoral que pode ter continuidade nas europeias de Maio de 2014, um mês antes da tão desejada saída da tróica, eleições europeias que vão gerar uma inflexão ideológica na Europa, da direita para o centro-esquerda, motivada e acelerada pela crise social e económica no Velho Continente e pela incompetência e incapacidade das instituições comunitárias e seus dirigentes em encontrarem o antídoto para esta recessão e estagnação.
Portas teme que o CDS seja desvalorizado no quadro da actual coligação e que o seu partido seja atirado para uma dramática luta pela sua sobrevivência eleitoral e política que ainda por cima não será ajudada em nada pelas europeias do próximo ano que poderiam compensar um desaire eleitoral nas autárquicas. Sondagens recentes mostraram que o CDS está em queda livre, sendo o último partido nas preferências dos portugueses o que certamente causou alarme e fez trocar os sinais de emergência. Ao mesmo tempo essas sondagens dão conta que Portas consegue, apesar de tudo, resistir ao desgaste pessoal dos respectivos líderes partidários da coligação. Admito que foi esta constatação aliada à percepção de que Portas pode ser a salvação de um anunciado desaire eleitoral do CDS, que terá sido determinante para a posição de força adoptada pelo líder centrista, e repetida por outras figuras do CDS, relativamente à denominada TSU dos reformados e pensionistas. Portas sabe que se esta medida for tomada o CDS provavelmente passará a ter que lutar pela sobrevivência política enquanto partido. Estamos a falar do espectro plausível de uma pulverização do CDS que não é ficção, pelo contrário. Por isso, e conhecendo a maneira de ser de Portas, e a sua reconhecida habilidade política, sagacidade e inteligência admito como perfeitamente normal e adquirida que o governo de coligação, particularmente a dupla Coelho-cobrador de impostos tenham dificuldades acrescidas na imposição da austeridade cega que os caracteriza.
Passos Coelho no PSD tenta desvalorizar o impacto de uma derrota em Setembro - que estou certo vai gerar controvérsia e contestação interna nos dois partidos da coligação, incluindo o questionamento das respectivas lideranças - e contrariar o óbvio ao afirmar que "as próximas eleições não vão ser aquilo que tanta gente gostaria que fosse, uma espécie de pântano e de antecâmara do colapso nacional. Enquanto for primeiro-ministro não há situações de pântano em Portugal". Coelho disse ser sua obrigação, aconteça o que acontecer nas autárquicas, "governar e trazer o PSD para um exercício de responsabilidade", o que é incompatível com uma copiosa derrota eleitoral e com a consequente perda de legitimação do poder e da coligação em Lisboa" (LFM-JM)