quinta-feira, maio 01, 2014

Opinião: "O fim das previsões: morreu o meteorologista"

"Ontem morreu-nos mais uma manivela de subir a janela do automóvel. Vocês sabem, crescemos com um hábito e, um dia, damo-nos conta que ele acabou... Desta vez conhecemos o momento exato e ficaram as imagens, nove e tal da manhã, na RTP-1: alguém, com mapa ao fundo e números, diz-nos o tempo que vai fazer. O meteorologista foi a última manivela de janelas a deixar-nos - desde ontem não há mais uma só televisão portuguesa a contar-nos mentiras inocentes. Bons tempos em que nos prometiam boas abertas para amanhã e chovia; ou avisavam-nos de que choveria e não sabíamos o que fazer à gabardina... Mas ganhávamos sempre um bom motivo de conversa. Boa e querida meteorologia! E antiga. Lembro-me, há 400 anos, do velho Anthímio Shakespeare, julgo que no Canal Macbeth, lançar com voz de feiticeira, logo na abertura: "Quando nos voltaremos a encontrar/ No trovão, no relâmpago ou na chuva?" Parecia uma tragédia mas no dia seguinte afrontávamos aquilo de peito feito. Lembro-me, há 40 anos, do jornalista Vítor Direito, no jornal República, dizer, sem poder dizer, o desalento por o 25 de abril não chegar: "Andam para aí certos senhores, feitos meteorologistas, a prever "boas abertas". Mas o nevoeiro persiste." Afinal, os meteorologistas acabaram por acertar, mas, em paga, até eles foram varridos por uma frente fria. Hoje, a prever, só profetas que se enganam nas taxas de juros. E nós só ganhamos um definitivo sentimento de impotência" (texto de Ferreira Fernandes, no DN de Lisboa, com a devida vénia)