terça-feira, outubro 21, 2014

O complexo cenário político-governativo que Alberto João Jardim leva a Cavaco...



Li na imprensa que o Presidente do Governo Regional vai solicitar (ou solicitou) uma audiência com Cavaco Silva para perceber o que vai fazer o Presidente da República relativamente à ideia de substituição na chefia do governo do actual líder do PSD regional pelo novo líder social-democrata, a ser eleito nas directas de 19 de Dezembro e confirmado no Congresso Regional de 15 de Janeiro de 2015. De acordo com notícias publicadas hoje, Jardim até admite prorrogar o seu mandato, mas poderá ter cometido o lapso de não contar com algumas disposições regimentais que podem ter consequências políticas não ponderadas. Sei que Cavaco Silva estará na posse de um dossier reunindo todas estas informações. Por isso, esta audiência em Belém poderá revelar-se um tempo perdido, em meu entender.
Não acredito que Cavaco aceite uma mudança nesses termos porque as pressões políticas serão grandes. Aliás, constam-me que já começaram a ser feitas, embora discretamente. E o pior que se pode fazer é iludir-nos com cenários que, neste caso concreto, podem não ser plausíveis, porque o PSD da Madeira não controla alguns procedimentos parlamentares com repercussões políticas óbvias e contrárias ao pensado.
Passo a explicar:

- Aconteça o que acontecer no PSD da Madeira, caso subsista uma radicalização, sobretudo de discurso político dos candidatos, com acusações e ataques inclusivamente pessoais, entre candidatos, não acredito em qualquer tipo de solução pacífica;

- E isto nada tem a ver com o PSD regional, até porque no actual contexto político-parlamentar regional deixou de controlar a situação, nem sequer com o facto de haver alguns dos candidatos à liderança do partido que anunciaram que defender a convocação de eleições regionais antecipadas (seria uma antecipação de escassos cinco ou seis meses) caso vençam a corrida em curso. Tem a ver com procedimentos parlamentares regimentais e estatutários que explico e que colocam a iniciativa política fora de qualquer controlo da maioria;

- Não tenho a certeza de que mesmo com Alberto João Jardim em continuidade de funções, depois das directas e do Congresso Regional, a oposição não apresente uma moção de censura e que ela não seja aprovada, inclusivamente com votos de alguns deputados do PSD, quer sejam candidatos, quer sejam apoiantes de candidaturas vencedoras. Julgo que Alberto João Jardim está a pensar um quadro partidário que pode não consumar-se como ele deseja que aconteça e provavelmente esqueceu-se que a oposição tem algum espaço de manobra;

- A aprovação de uma moção de censura (e os deputados do PSD, como atrás referi nem sequer precisariam de votar a favor ou de abster-se, bastando que se ausentem do plenário no momento da votação) implica a queda do governo regional e a dissolução da Assembleia, independentemente de voltarem a ser feitas tentativas para encontrar uma outra solução de continuidade por mais alguns meses;

- No caso de um novo governo regional, não me parece plausível que o mesmo, remodelado ou não, inicie funções com uma nova liderança e novos protagonistas (caso fosse esse o cenário), na perspectiva do cumprimento da Legislatura (Outubro de 2015) sem apresentar uma moção de confiança ao parlamento. E quem me garante que essa moção de confiança é aprovada? Não sendo - e poderia recordar os procedimentos atrás enunciados no caso de uma moção de censura - o governo teria condições para manter-se em funções? Claro que não.

- Em caso de dissolução do parlamento - que podemos estimar para Janeiro ou até meados de Fevereiro de 2015, tudo dependendo se for tomada logo uma decisão mais radical ou se o Presidente da República optar por ganhar algum tempo e encarregar o Representante da República de estabelecer contactos para apurar da viabilidade de uma solução que garanta a continuidade do parlamento regional em funções, até Outubro sem eleições.

- No caso de uma dissolução sem cumprimento da Legislatura o Presidente tem 55 dias para convocar eleições. Lembro que o artigo 19.º da lei eleitoral regional (Marcação da eleição) diz no seu nº 1 que "o Presidente da República marca a data da eleição dos deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, com a antecedência mínima de 60 dias ou, em caso de dissolução, com a antecedência mínima de 55 dias". Acrescenta o nº 2 que "no caso de eleições para nova legislatura, estas realizam-se entre o dia 22 de Setembro e o dia 14 de Outubro do ano correspondente ao termo da legislatura".

Além disso coloca-se outra questão: o Estatuto da Madeira diz claramente que implica a demissão do Governo Regional, entre outros itens, a "apresentação, pelo Presidente do Governo Regional, do pedido de exoneração".

Segundo o artigo 60º (Moção de confiança), nº 1, do Estatuto, "o Governo Regional pode solicitar, por uma ou mais vezes, à Assembleia Legislativa Regional a aprovação de um voto de confiança sobre qualquer assunto de relevante interesse para a Região, sobre a sua actuação ou sobre uma declaração de política geral". O artigo 61º ("Moções de censura") do Estatuto em vigor, "por iniciativa dos grupos parlamentares, pode a Assembleia Legislativa Regional votar moções de censura ao Governo Regional sobre a execução do seu Programa ou assunto relevante de interesse regional". Acrescenta o nº 2 deste artigo que "as moções de censura não podem ser apreciadas antes de decorridos sete dias após a sua apresentação" esclarecendo, nº 3, que "se uma moção de censura não for aprovada, os seus subscritores não podem apresentar outra durante a mesma sessão legislativa".
O artigo 62º ("Demissão do Governo Regional") do Estatuto Político da Madeira sublinha, nº 1, que "implicam a demissão do Governo Regional, entre outros itens, a "apresentação, pelo Presidente do Governo Regional, do pedido de exoneração" (alínea b) e a "aprovação de uma moção de censura por maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções" (alínea d). Esclarece também que "em caso de demissão, os membros do Governo Regional cessante permanecem em funções até à posse do novo governo". Refira-se que entre os "poderes dos deputados" figuram a possibilidade de "apresentar propostas de moção" (alínea d), artigo 8º do Regimento da Assembleia) poderes estes que são reservados apenas aos grupos parlamentares. 
Tenho para mim que independentemente da decisão que Cavaco Silva tome - e não acredito que ele assuma com Alberto João Jardim qualquer compromisso político sobre esta matéria - há factores político-parlamentares que nem o Presidente da República, nem Alberto João Jardim nem mesmo o PSD regional, com uma escassa maioria de deputados, alguns deles conotados com as diferentes candidaturas - controlam. O que me leva a acreditar que inevitavelmente teremos eleições regionais em finais de Março ou início de Abril - repito, isto caso seja aprovada uma moção de censura ao Governo Regional e Cavaco não aceite a mudança de protagonistas, decidindo com base na ideia de que, se for esse o caminho, a antecipação de eleições - previstas para Outubro - será apenas uma questão de cinco meses, porventura de quatro meses se contarmos com todo o processo de apuramento de resultados, e procedimentos legais estabelecidos, até à posse de um novo executivo regional saído de eleições. Por isso a pergunta que neste momento se coloca é esta: que garantias tem o PSD da Madeira e Alberto João Jardim que o parlamento regional não fará tudo para provocar eleições antecipadas, independentemente de qual a vontade (que também pode influenciar) do futuro líder do partido?