terça-feira, outubro 06, 2015

Legislativas-2015: Bloco fez mais mossa à direita do que o PS

A direita perdeu a maioria absoluta e o PS, que reclamava essa mesma maioria, nem sequer conquistou uma relativa. O Bloco de Esquerda impediu os desejos socialistas e conseguiu, até, causar mais danos à direita do que o partido liderado por António Costa. Fazendo sobretudo muitos estragos no PS, o BE só lá chegou porque entrou também em terrenos de desencantados com PSD e CDS. Um rescaldo das eleições em sete pontos
1. BLOCO FEZ MAIS MOSSA À DIREITA DO QUE O PS
Embora o ganho líquido dos deputados perdidos pela coligação Portugal à Frente (PàF) — 24, numa contabilidade que não leva em linha de conta os mandatos da emigração —tenha sido feito em partes iguais entre o Partido Socialista e o Bloco de Esquerda , é bastante significativa a forma como os
bloquistas roubaram eleitores e mandatos à direita. As bancadas de Bloco e PS têm agora mais 11 deputados cada — os restantos ganhos foram da CDU (um) e do PAN, que se estreia com um deputado em São Bento. E não é a mesma coisa ganhar 11 deputados para quem parte de uma base de apenas oito (caso do BE) ou que já tinha uma bancada que era nove vezes maior (74) circulos
Ainda que não se possa quantificar a transferência direta de votantes do PSD e do CDS em 2011 para o Bloco, é evidente a forma como o partido liderado por Catarina Martins entrou em terrenos da direita. Um objetivo eleitoral que foi claramente assumido no comício realizado em Leiria, onde Marisa Matias enriqueceu o léxico da campanha com um apelo aos “lesados do PSD e do CDS”.
Foram sete os distritos onde o Bloco subiu a representação parlamentar. Em dois deles, ganhando o único deputado perdido pela direita: Braga e Leiria. Num terceiro distrito, Santarém, pelo qual nestas eleições se elegeu menos um deputado, o BE conquistou um dos dois mandatos perdidos pela direita. Noutros círculos, o BE apropriou-se apenas de uma parte do saque: Coimbra (um,
repartindo com os socialistas as perdas da direita); Lisboa (2, num distrito em que a coligação viu fugir sete); Porto (3, em quatro perdidos pela direita); Setúbal (1, num círculo que ganhou um deputado, e a direita conta com menos dois, tantos quantos os ganhos pelo PS); e Madeira (1, face à perda de dois pela direita).
2. PORTO, O SONHO DO BLOCO E O PESADELO DO PS
Foi no distrito em que a lista do BE foi liderada por Catarina Martins que os bloquistas registaram a maior subida de deputados: um “colossal aumento” de 150% (passaram de dois para cinco). E foi, certamente, o pior desempenho do PS. no dia 4 de outubro. Num círculo eleitoral onde a direita perdeu quatro deputados, os socialistas nem sequer conseguiram ganhar um para amostra. Melhor fez a CDU, que conquistou o outro mandato que fugiu à coligação (os comunistas tem agora três deputados pelo Porto). Somados, os dois partidos à esquerda do PS duplicam a representação (de quatro para oito deputados).
3. DIREITA DERROTADA À BEIRA-MAR
Como se esperava, foi em distritos do litoral, os mais populosos, que os partidos da PàF registaram as maiores perdas. Só em dois círculos na linha costeira (considerando que Beja é eminentemente interior) é que os mandatos da PàF são os mesmos de PSD e CDS em 2011: Viana do Castelo e Aveiro. Nos restantes, houve perdas: Braga (1), Porto (4), Coimbra (2), Leiria (1), Lisboa (7), Setúbal (2), Faro (2), Madeira (2) e Açores (1). Em dois distritos do interior também a direita elegeu menos deputados: Santarém (2) e Guarda (1).
4. UMA ABSTENÇÃO RECORDE
Apesar de os números apurados ao longo de dia poderem prenunciar uma maior afluência às urnas, e as projeções das televisões emitidas às 19 horas validarem essa possibilidade - por exemplo, numa primeira reação a tais estimativas, o diretor de campanha do Bloco de Esquerda falou de uma "abstenção historicamente baixa"), o que é um facto é nunca tantos portugueses ficaram em casa (4.065.288, quando ainda falta apurar os resultados da emigração). A abstenção foi de 43,07%, mais de cinco vezes superior à registada nas primeiras eleições livres, há 40 anos.
5. COSTA PERDE NO CONCELHO DE LISBOA...
O secretário-geral do PS disse por várias vezes na campanha que pretendia "governar o país como governou a Câmara de Lisboa". O tiro saiu pela culatra.
António Costa não ganhou as eleições no concelho que liderou durante oito anos, nos quais ganhou três eleições, duas delas com maioria absoluta. Ontem, Costa obteve apenas 108.143 votos, menos oito mil do que obteve em 2013 (116.425 votos) e uma perda ainda maior (cerca de 15 mil votos) face aos obtidos em 2009 (123.372 votos). E a descida, em números absolutos, no concelho de Lisboa é ainda mais significativa levando em conta que votaram nestas legislativas mais do que em qualquer eleição autárquica: 311 mil pessoas, contra 228 mil em 2013 (quando Costa teve como principal opositor Fernando Seara) e 280 mil em 2009 (quando a presidência foi disputada por Pedro Santana Lopes).
6. ... MAS TEM A REDENÇÃO NO DISTRITO
O distrito de Lisboa, o que elege mais deputados, é aquele em que o PS ganha mais mandatos: quatro, passando agora para 18. Dos sete perdidos pelos partidos da direita, os socialistas arrebataram, assim, a maioria. Os restantes foram ganhos por Bloco (dois) e PAN (um). Só em três círculos o PS faz o pleno das perdas direita: Faro, 2 deputados; e Açores e Guarda, um cada.
7. BLOCO DE ESQUERDA, 16 VS CDU, 4
Apesar de tanto Catarina Martins como Jerónimo de Sousa terem dito que Bloco de Esquerda não compete com a CDU (e vice-versa), e que ambos combatem antes para derrotar a direita, o que é um facto é que nesta legislativas os bloquistas superaram largamente a coligação liderada pelos comunistas. Não tanto no número de deputados de cada um (19-17 para o Bloco), ou na percentagem (10,2% contra 8,3%, a favor do BE), mas mais na implantação nacional que cada força tem neste momento.
Dos 20 círculos apurados (os 18 do continente e as regiões autónomas), o Bloco toma a dianteira em 16, tendo a CDU vencido apenas nos três distritos do Alentejo (Beja, Évora e Portalegre) e naquele que tem também alguns concelhos situados no Alentejo (Setúbal). (texto do jornalista do  Expresso, PAULO PAIXÃO,com a devida vénia)

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