sexta-feira, outubro 02, 2015

Mania de escrever: factos da campanha eleitoral

CAMPANHA ELEITORAL - Lamentavelmente foi uma campanha eleitoral onde os grandes temas, aqueles que mais interessam aos portugueses e ao seu futuro, estiveram distantes, bem distantes, do debate, já que os principais partidos preocuparam-se com picardias e com a a disputa partidária, por vezes quase uma disputa pessoal, tudo isto em nome (e por causa) de uma bipolarização mais ou menos falhada, mas que pode conduzir o pais para o impasse da ingovernabilidade.
FARSAS SOCIALISTAS - A campanha eleitoral permitiu até farsas socialistas, como foi o caso protagonizado por uma alegada cidadã anónima, tão espontâneo que depois de percebeu que se tratava de uma militante socialista que ocupou vários tachos desde os tempos de Sócrates e que "interrompeu" (vejam só o embuste...) Jorge Coelho num comício em Setúbal para manifestar o desgosto pelo facto do filho estar na China. Um filho que emigrou não por causa do dinheiro, segundo a própria. Uma palermice, mais uma, à moda de um desorientado PS de Costa. Uma tristeza. Como dizia o outro, "não havia necessidadi"...
CAVACO SILVA - Pretendeu dar nas vistas, falou a partir dos EUA das eleições, garantiu que já sabia o que ia fazer depois de 4 de Outubro, esqueceu-se que os portugueses ainda não tinham votado. Pôr a carroça à frente dos bois dá nisto! Depois, em nova asneirada - o costume - anuncia que afinal não marcará presença nas comemorações do 5 de Outubro, Dia da República, quando poderia estar presente, sem discursar ou fazer declarações aos jornalistas para não se enterrar mais. Felizmente que faltam 4 meses para nos virmos todos livres desta triste personagem.
PAULO PORTAS - É o elo mais fraco desta coligação - e na noite de 4 de Outubro, quando percebermos da distribuição dos deputados que PSD e CDS vão eleger no próximo domingo - mas assumiu-se como a segunda figura da coligação, apesar de politicamente ter tido um protagonismo mais acentuado do que Passos, sobretudo quando se tratava de lidar politicamente com o PS. O "snipper" da coligação, como foi catalogado pelos socialistas, acabou por ter um contributo importante nas dúvidas que foram sendo suscitadas em torno do PS e de Costa, ao ponto dos socialistas, terminada a amanhã, não terem sequer a certeza de que serão o partido mais votado. Evidente foi a constante preocupação de Passos em defender a 2ª figura da coligação. Embora pouco preocupado com isso, as pessoas esqueceram rapidamente o episódio da demissão irrevogável ou a treta da linha vermelha no que às pensões e reformas diz respeito. Portas deixou de liderar o partido dos agricultores, dos pensionistas e dos reformados. As pessoas dar-lhe-iam uma derrota histórica caso concorresse sozinho. E até nisso, ao formalizar a coligação previamente ao acto eleitoral, Portas foi hábil e perspicaz, porque jogou nessa decisão a sua própria sobrevivência política. 
PASSOS COELHO - Realizou uma campanha eleitoral inteligente, deixando para Portas, seu parceiro da coligação, o lado mais conflituoso na disputa com os socialistas. Inteligente ao ter aceite e seguido religiosamente o guião de campanha que lhe foi propiciado por especialistas contratados, depois de um estudo prévio ao mercado eleitoral, insistindo repetidamente nos temas que segundo esse levantamento eram os mais sensíveis às pessoas e pior isso mesmo passíveis de não gerarem polémicas. Nunca apresentou soluções concretas para "dossiers" mais polémicos como a segurança social ou a carga fiscal, que representa um vergonhoso roubo do poder, um saque institucionalizado pelo governo e pela maioria absoluta que lhe permitiu a arrogância e o autoritarismo asqueroso que marcou estes quatro anos. Passos foi eficaz no discurso do medo que adoptou relativamente ao PS e a um alegado regresso ao passado, tendo conseguido semear a dúvida junto de eleitores indecisos que recusando votar na coligação PSD-CDS, pareciam inclinar-se para o PS e para Costa. A evolução das sondagens, no que aos socialistas diz respeito, mostram que os eleitores visados por Passos acabaram por interiorizar o legado de Sócrates e não escondem o medo de que com Costa, que foi o nº 2 de Sócrates, corressem novos riscos de regresso a esse legado deixado pelos socialistas depois da derrota eleitoral em 2011: austeridade, falência, troika, memorando de entendimento, etc. Apesar de ser a cara mais negra da austeridade que deixou marcas em milhões de cidadãos, num país que tem hoje mais ricos que tinha em 2011 e que teve sempre milhares de milhões de euros para gastar com a banca e defender a corrupção no sistema bancário, a gatunagem do colarinho branco,etc, não hesitando em roubar aos cidadãos para ter essa disponibilidade. Falamos de uma personagem que não sendo mais popular que Costa, primou a governação por uma teimosia cega, adoptando medidas polémicas que geraram mais pobreza, mais falências, mais emigração, sobretudo de jovens, etc. Passos conseguiu, caso as sondagens mostrem que têm razão,  inverter a tendência de uma derrota que seria histórica - embora esse desfecho não esteja ainda totalmente posto de parte, aguardemos -  dada como certa há seis meses e que hoje deixou de ser um desfecho tão adquirido como alguns julgariam ser possível e inevitável.
JERÓNIMO SOUSA - Se há coisa que não podem acusar o PCP e o líder dos comunistas é de contradição, de oportunismo ou de andarem a fazer campanha apenas agora. O PCP tem por hábito estar no terreno, tem um longo historial de combate e de luta e muita experiência política que faz com que os comunistas encarem cada acto eleitoral como um combate mas mantendo sempre a mesma retórica e o mesmo discurso. Os comunistas evidenciaram alguns sinais de incómodo quer devido às projecções dadas ao Bloco, quer por causa das críticas que o PS dirigiu ao PCP, particularmente Manuel Alegre (que até colocou Cunhal na campanha...) um e outro responsabilizando a outra esquerda por qualquer desaire socialista que coloque a direita no poder. Jerónimo tem mais aceitação junto das pessoas do que o partido que lidera e isso permite um contacto mais fácil na campanha eleitoral, passível de gerar enganos, já que provavelmente não terá o retorno em votos e mandatos que ele esperará e deseja. Considero que dificilmente os comunistas deixarão de subir na votação e de eleger mais deputados, em grande medida porque muitos eleitores que votam à esquerda não se reviram no PS, no discurso de Costa e nas suas propostas.
CATARINA MARTINS - Confesso a minha surpresa. Não dava um tostão pelo Bloco e por ela nesta campanha e nesta conjuntura. Contudo acabou por protagonizar uma boa campanha eleitoral, muito politica, de muito combate, indiferente às críticas do PS -  tentando responsabilizar os demais partidos da esquerda pela vitória da coligação PSD-CDS - e sem olhar para o PC.  O Bloco sabe que disputa muito eleitorado ao PCP, porque os "mares da pescaria" são  comuns, mas centrou o discurso político agressivo nas consequências da austeridade, nos jovens que emigraram, no ataque violento à coligação de direita e com muita contundência. Catarina Martins, que verá o Bloco aumentar os deputados e ter mais votos, sai desta campanha vencedora e certamente obrigou muitas pessoas, e  começar por mim, a mudarem a sua opinião sobre as suas capacidades políticas. A pequena (em estatura) dirigente do Bloco acabou por ser bem alta no combate travado. Mas comete um erro,o de vender a ideia de que pode ser uma solução para o PS em caso de uma maioria de esquerda, algo que ninguém percebe muito bem, considerado o antagonismo das suas propostas quando comparadas com as do PS,  a começar pela Europa e pelo euro. Não esqueço também que defende o fim da Zona Franca da Madeira, numa atitude que não creio seja seguida pelo Bloco na Madeira, porque me parece confundir alhos com bugalhos.
SONDAGENS - Estas foram as eleições onde as sondagens, quer as chamadas "grandes sondagens" quer as novas sondagens diárias (as "traking polls") marcaram presença mais intensa e terão em certa medida condicionado e influenciado muita coisa. A começar pelos partidos. Embora fazendo parte de qualquer processo eleitoral, percebe-se, depois de toda a polémica e das dúvidas suscitadas, que as empresas que as realizam ganham dinheiro vendendo-as aos médias e aos partidos, apesar de toda a polémica e dos debates que elas suscitaram, e embora reconhecendo que há métodos diferentes que não podem ser comparados. Nenhuma sondagem é absolutamente fiel. Temos por isso que aceitar que as empresas não quererão perder a face depois de 4 de Outubro.  Na Escócia, na Inglaterra, na Grécia e agora na Catalunha, a credibilidade das empresas de sondagens, depois de conhecidos os resultados oficiais, foi posta em causa e desacreditada. Há mesmo um debate nesses países sobre a possibilidade dessas sondagens, pelos riscos de manipulação,pelas dúvidas sobre a isenção necessária e pelos interesses empresariais subjacentes, poderem ser proibidas durante as campanhas eleitorais, a verdade é que no caso português ficaremos a conhecer a 4 de Outubro qual a assertividade e consistência de todas essas sondagens publicadas.
ANTÓNIO COSTA - Combateu sempre António José Seguro e por causa de uma vitória magra nas europeias não lhe perdoou.  Queria mais, exigiu mais. O mais que ele agira não é capaz de dar ao PS. A fome de poder era grande. Eleito em directas como se se tratasse de um "salvador" Costa rapidamente se foi revelando um fracasso em termos de mensageiro e de imagem, já que nunca conseguiu afirmar o PS como a verdadeira alternativa à coligação de direita. Depois de 4 anos de austeridade violenta que deixou um percurso social verdadeiramente desolador, Costa e o PS não conseguiram convencer uma parcela muito grande de eleitores,os chamados eleitores flutuantes, totalmente descomprometidos. Não foi capaz de travar a ideia repetida pela coligação de que com ele era o regresso ao passado recente e mais do mesmo comparativamente ao que se passou no tempo de Sócrates.  A ameaça de mais falência, de mais troika, de mais austeridade, fez com que muitos eleitores, indecisos, segundo as sondagens, hesitem em votar no PS, apesar de recusarem fazê-lo na coligação. Mas as sondagens mostram ainda outra coisa: o PS não foi capaz de resistir às investidas da esquerda, PCP e Bloco e nem mesmo o discurso desesperado de Manuel Alegre (que trouxe Cunhal para a campanha) resolveu o problema. Muitos dos votos e dos deputados que PCP e Bloco elegerão domingo se-lo-ão à custa da desilusão de muitos eleitores relativamente ao PS.
Depois de ter ganho um debate televisivo a Passos, Costa cometeu vários erros: a incapacidade de desvendar os mistérios do seu manifesto eleitoral, a ausência de explicações sobre como encontrará recursos financeiros para dar corpo a medidas que incluiu no documento em causa, a desvalorização do segundo grande debate, nas rádios, esquecendo (?) que estava a ser gravado para transmissão pelas televisões - no qual cometeu várias gaffes e revelou fragilidade no discurso e contradições, deixando que Passos ganhasse este debate de forma indiscutível. Uma campanha a que não faltou a insinuação a amizades com a Grécia a que se juntou o grande erro, em meu entender, de Costa, o de ter anunciado que não viabilizaria qualquer governo da coligação, caso perdesse eleições, e que recusaria votar o programa de governo - quando se votam moções de confiança ou de censura - deixando transparecer que poderia ser a causa de instabilidade politica que causaria problemas ao pais. Costa ainda tentou emendar mas o mal estava feito. Embra não tenha ganho nem perdido nas urnas, Costa já perdeu, porque ninguém acreditava que nesta altura a coligação, que é a cara da austeridade, estivesse a disputar a vitória e liderasse todas as sondagens, sejam elas diárias ou as chamadas grandes sondagens. Julgo que um desaire eleitoral domingo será o fim da era de Costa no PS. E pior do que isso, poderá inclusivamente terminar a carreira política de um socialista que sempre teve esta ambição, a de liderar o PS, mas que provavelmente não estava preparado para os desafios e exigências que isso implicava. Lembro que tudo começou mal, com aquela barracada estranha em torno dos cartazes nos quais o PS usou a imagem e o nome de pessoas que não tinham dado autorização para tal.

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