O Banif e a venda do Novo Banco são os maiores incómodos políticos para
o Governo PS apoiado pelo BE e PCP. O PS terá que contar com o PSD para tratar
dos bancos tal como manda a União Europeia. Como lidar com a banca segundo as perspectivas da esquerda? Este é o
maior desafio de António Costa e não está a ser bem sucedido. O acordo que o
tornou primeiro-ministro já falhou com a resolução do Banif e a venda do Novo
Banco tem a oposição do BE e do PCP. No caso do Banif, o PSD acorreu com os
seus votos para aprovar a resolução. E terá que continuar a fazê-lo sempre que
se trate de viabilizar soluções para a banca segundo os mandamentos de
Bruxelas. Os parceiros do PS não estão disponíveis para isso.
‘Uma situação política complicada’
«Para nós isto é muito pesado. Não significa que se vá abrir uma crise
política, já que não falta uma maioria parlamentar para votar a favor das
decisões do BCE», afirma uma fonte bloquista, apontando para o PSD. Mas mesmo
sem crise política há um grande incómodo nos partidos à esquerda do PS. «Que
seja um Governo com o apoio da esquerda a tomar todas estas decisões torna
complicada a situação política», afirma a mesma fonte. Trocando por miúdos:
haverá um dia em que os dirigentes mais à esquerda se sentirão demasiado
incomodados por serem suporte de um Governo que faz demasiadas coisas contra as
suas convicções. Um artigo do dirigente do BE Jorge Costa, publicado no site oficial do
partido – Esquerda.net – torna pública esta preocupação. «A recapitalização do Novo Banco foi anunciada
repentinamente, no final do ano, ainda o país começava a digerir, entre
rabanadas, a fatura do Banif. Celebrou-se então um estranho unaninimismo. Nas
reações, os contribuintes ficaram a salvo enquanto eram levados para o ‘banco
mau’ os créditos sénior que tinham sido protegidos no verão de 2014. No Banif
como no Novo Banco, as ‘regras europeias’ são o novo mantra da inevitabilidade.
Só que a única verdadeira regra europeia é o diktat do BCE e da Comissão
Europeia», escreve o dirigente.
Mas Jorge Costa vai ao osso da questão? O que quer fazer o Governo,
afinal, que o BE apoia? Aparentemente, o contrário do que o Bloco defende.
«A questão, aqui, não é de ‘crise política’. Com a viabilização do
resgate do Banif, Passos esclareceu, ao seu estilo, que o PSD fará sempre
maioria para obedecer ao BCE no desmantelamento do sistema bancário português
(...) A questão, aqui, é de projeto político. Num artigo de ano novo, António
Costa prometeu reorientar a política de financiamento bancário, ‘do rentismo do
crédito ao consumo e à compra de casa própria para o financiamento do
investimento produtivo’. Mas Costa sabe que não pode ‘reorientar’ o Santander
espanhol, nem o BCP angolano, nem o BPI espanhol-angolano. Muito menos se não
tiver instrumentos fortes de banca pública que condicionem todo o sistema».
Jorge Costa conclui: «É por isso que o Novo Banco não deve ser vendido. A
escolha é, portanto, do PS. O Governo sabe que também há, no parlamento, uma
maioria para defender Portugal dos predadores».
Novo Banco não faz parte do acordo de esquerda
O Governo desdramatiza a
importância do Novo Banco na relação do Executivo com os partidos que
lhe dão apoio parlamentar : «O Novo Banco não faz parte do acordo de esquerda»,
afirma fonte governamental. É um facto que tanto BE como PCP aceitaram empossar
o Governo PS partindo do princípio que o programa do Governo assumia todos os
compromissos com as regras europeias. Aliás, o mal-estar estende-se a alguns dirigentes do PS. João Galamba, vice-presidente da bancada
socialista, chegou a defender que o Novo Banco deveria ficar na esfera pública.
Mas, segundo o Governo, não há nada a fazer: «A única maneira de fazer
diferente é saindo da União Europeia, coisa que nem o Governo nem os
portugueses querem», afirma fonte governamental. Apesar de ‘não haver nada a fazer’, o dirigente João Galamba, em artigo
de opinião publicado no Expresso, argumentou: «Se o Estado for obrigado a
vender, então as regras deixarão de ser apenas sobre recuperação e resolução
bancária, passando a constituir uma forma inaceitável de penalização da
propriedade pública. No caso de venda forçada, teríamos a privatização dos
ganhos original, seguida de uma socialização dos custos na sequência da crise,
seguida novamente de uma privatização (forçada) dos ganhos». E concluiu: «O
Estado pode não ter alternativa a intervir, mas tem de ter alternativa a
vender».
A questão é que o drama do ‘não há alternativa’ marca o Governo PS desde
o início. Apesar de prometer que se iria bater nas instâncias europeias contra
as regras que considerava erradas, António Costa comprometeu-se com o estrito
cumprimento de todas as obrigações perante a Europa. E todos os compromissos
europeus ficaram intocáveis nos vários acordos que celebrou com os partidos de
esquerda que lhe permitiram tornar-se primeiro-ministro. O BE foi mais incisivo
contra a solução apoiada pelo Governo – mas que será levada a cabo pelo Fundo
de Resolução e pelo Banco de Portugal – de vender o Novo Banco, desafiando o PS
a fazer diferente. O PCP foi igualmente contra a solução: «O PCP reafirma que a melhor
solução para o Novo Banco, que o colocará ao serviço da economia nacional e das
famílias portuguesas, é ficar sob controlo público e não ser vendido a um ou
mais grupos privados. O facto de o refinanciamento do Novo Banco, no valor de
1.985 milhões de euros, desta vez realizado não à custa de dinheiros públicos,
mas dos obrigacionistas institucionais, não resolve um problema de fundo: o
facto de o Estado português ter injectado 3,9 mil milhões de euros, que irá ser
pago por todos os portugueses» (texto da jonalista do Sol, Ana Sá Lopes)
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