quinta-feira, maio 26, 2016

Opinião: O desastre comunicacional de Costa

António Costa - pelo menos é essa a minha percepção - julga que tem uma boa imagem pública que lhe serve de muito. Erradamente. Não tem imagem pública nenhuma. A imagem de Costa, depois das eleições de 2015 e da golpada política perfeitamente legitimada no parlamento nacional, vai sendo construída em função da popularidade das medidas que vai anunciado ou tomando. Se de um momento para o outro isto der para o torto, o destino de Costa será politicamente bem pior, mais doloroso e quiçá definitivo, bem pior do que aquele que aconteceu a Sócrates em 2011.
Aquela cena idiota da "vaca que voa", e do bicho entregue numa cerimónia pública (!) a uma atrapalhada ministra da administração - que não sabia bem se aceitava a "oferta" patética que lhe estavam a fazer ou se se metia num buraco - foi demasiado ridícula para ser levada a sério, embora mostre bem as insuficiências do actual primeiro-ministro, sobretudo quando se espera dele uma imagem pública sóbria e consolidada. Sem diatribes.
Costa tem um défice de confiança politica junto do eleitorado – em parte porque foi um dos braços-direitos de Sócrates e as pessoas ainda não esqueceram isso - e foi por causa disso que, mesmo depois de 4 anos de austeridade violenta e criminosa de uma descarada roubalheira protagonizada pelo governo de Passos e do CDS de Portas, não conseguiu ganhar as eleições legislativas. Nem sequer levou o PS ao estatuto de partido mais votado. Graças a uma abstenção elevada, novo recorde, e ao natural e esperado desgaste da coligação anterior, Costa acabou por ser levado ao poder não pelos méritos do PS mas pelo facto de PCP e Bloco de Esquerda terem viabilizado o entendimento parlamentar, sendo por isso natural e incontornável que politicamente dependa desses partidos e dos seus interesses estratégicos.
Ao contrário do que ele pensa - provavelmente porque ter sido comentador da "Quadratura do Círculo" na SIC Notícias o fez cair nessa ilusão - Costa tem dificuldade de expressão, tem uma mensagem politica mal articulada, tem ideias mal estruturadas, tem dificuldade no debate aberto – que nada têm a ver com os debates de estúdio com mais dois amigos... - o que explica esta repetida incompetência mostrada em termos comunicacionais.
Uma vez mais, desta feita com os contratos de associação com os colégios privados - e eu até entendo a posição do governo e não me repugna nada compreender os seus argumentos  - Costa aceitou ir a reboque da estratégia aventureirista e pirosa de um ministro da educação sem perfil político para o cargo, sem competência no sector e sem qualquer experiência profissional, em vez de impor um ritmo mais cauteloso. E mais do que isso: em vez de obrigar o ME a explicar em linguagem simples, o que se passa com este tema e quais os motivos concretos que levaram o governo a tomar a decisão que tomou, deixo-o vaguear num clima de insegurança política que obrigou à mobilização de  vários ministros políticos para servirem de almofada ao titular da educação. Recuso aceitar, e direi as vezes que forem precisas, que nos dias que correm os colégios privados, sejam eles religioos ou não, insistam na teoria idiota de que têm diteitos conquistados e que podem estar quase que à margem do sistema, funcionando às mãos de cooperativas ou de uma casta de accionistas que muitas vezes ninguem sabe quem são, que vivem à custa do sistema, pagando-se a si próprios salários elevadíssimos, vivendo às custas dos milhões do erário público.  E que tudo isso seja feito à custa da escola pública, de uma estratégia de desacreditação da escola pública, de supressão constante de rescursos financeiros devidos, da aposta na sua degradação e desvalorização, na repetição de um discurso de hostilização da escola pública, de enxovalho dos seus docentes, de ridicularização dos rankings - quando na realidade se esconde a componente elitista e selectiva que esses colégios praticam, tudo com o dinheiro público.
Eu não aceito que se venda a ideia, patética, de que um docente com 20 ou 30 anos de actividade profissional só porque trabalha no sector público é uma espécie de besta quadrada incompetente, ao invés de um qualquer tótó que, com 4 ou 5 ou 6 anos de actividade e só porque trabalha num colégio privado, se julga o maior, mergulhado subitamente numa espécie de banheira de cagança, de  sapiência e de sabedoria apressada.
Comigo não colhem esses argumentos.
Não admito que uma escola pública não tenha dinheiro para comprar papel higiénico, ou para pagar o gás do sistema de aquecimento das suas infraestruturas desportivas e que ao lado, um qualquer colégio privado, ande a gastar milhões em mordomias e luxos que são pagos pelo dinheiro dos contribuintes, a esmagadora maioria dos quais sem condições para terem os filhos nesses colégios privados que sustentam via orçamento.
Eu não admito que os professores que agora tanto se empenham em protestos na rua – apesar de nunca terem feito nada quando colegas seus da escola pública iam sendo despedidos e ficaram sem trabalho – manipulem criminosamente as criancinhas, vestindo-as de amarelo, e tentem criar uma espécie de muro selectivo entre a escola pública e os colégios privados só porque neles trabalham.
Acho bem que defendam os seus postos de trabalho, acho bem que façam ouvir a sua voz, mas deixem de manipular as criancinhas num espectáculo ridículo que faz lembrar os tempos da outra Senhora, da ditaduras ou das sociedades condicionadas e sem vontade própria como a Coreia do Norte. É vergonhoso vermos criancinhas, algumas delas nem idade têm para andarem na rua sozinhas, a berrarem ao som dos protestos dos professores, muitos dos quais têm nesses colégios contratos de trabalho esquisitos e aceitam fazer tudo o que na escolha pública nunca aceitariam  fazer por alegadamente serem tarefas que ultrapassam as suas obrigações profissionais.
O problema é que nesses colégios privados, pagos pelo erário público, os docentes são obrigados a aceitar isso e tudo o que lhes seja pedido sob  pena de serem postos na porta da rua no final do ano, ou seja, de ficarem sem trabalho.
Neste contexto Costa meteu água, tanta ou mais que o que meteu seu ministro da educação. Revelaram ambos uma doentia incapacidade, diria mesmo uma deprovável incompetência, de gerirem, em termos políticos, de comunicação política e do discurso mediático direccionado para a opinião pública em geral, um dossier demasiado polémico - e já se sabia que assim seria - para ser gerido de uma forma tão pateticamente amadora, tão idiota. Não creio que o sector se estabilize sem que haja cedência e que se crie uma espécie de ano de transição para que esta medida seja adoptada. Os colégios ganhariam tempo provavelmente à espera de novas eleições e de um novo governo.
Tenho a sensação - e não sei o que vai acontecer - que Costa perdeu facilmente uma "batalha" que teria sido facilmente disputada e ganha, porque o tema é facilmente perceptível pelas pessoas, caso lhes tivessem sido dadas condições, antes de tomadas as decisões, para perceberem os fundamentos da decisão e as causas mais próximas das opção política tomada.
Estou em crer - e o caso das 35 horas é outro exemplo demonstrativo da fragilidade deste governo socialista apoiado da esquerda – que a persistência deste amadorismo comunicacional no governo de Costa poderá ser fatal e poderá ser, a prazo, uma das causas próximas da sua queda e do falhanço desta coligação parlamentar de esquerda  (LFM)

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