domingo, julho 03, 2016

Constitucional deu nega a recurso de dez deputados à Assembleia Legislativa da Madeira

ACÓRDÃO Nº 421/2016
Processo n.º 547/16
Plenário
Aos vinte e sete dias do mês de junho do ano de dois mil e dezasseis, achando-se presentes o Conselheiro Presidente Joaquim de Sousa Ribeiro e os Conselheiros Fernando Vaz Ventura, Pedro Machete,  João Cura Mariano, Lino Rodrigues Ribeiro, Catarina Sarmento e Castro, João Pedro Caupers, Carlos Fernandes Cadilha,  Ana Maria Guerra Martins, Maria Lúcia Amaral, José António Teles Pereira e Maria José Rangel de Mesquita, foram trazidos à conferência os presentes autos, nos termos do n.º 2 do artigo 52.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional. Após debate e votação, e apurada a decisão do Tribunal, foi pelo Conselheiro Presidente ditado o seguinte:

1. Um grupo de dez deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira requereu ao Tribunal Constitucional a declaração de ilegalidade do acervo normativo constituído pelo artigo 3.º do Decreto Legislativo Regional n.º 6/2016/M, que «cria o Instituto para a Qualificação, IP-RAM», e pelas Portarias n.º 114/2016 e 115/2016, ambas das Secretarias Regionais das Finanças e da Administração Pública e de Educação, a primeira que «aprova os Estatutos do Instituto para a Qualificação, IP-RAM, designado por IQ, IP-RAM», e a segunda que «regulamenta a Escola Profissional Dr. Francisco Fernandes (EPFF), nos termos do regime jurídico aplicável às escolas profissionais», em particular os artigos 8.º, 10.º, 12.º, 15.º e 16.º desta última.
Invocam, para apresentar tal pedido, o disposto na alínea h) do n.º 1 do artigo 22.º da Lei n.º 130/99, de 21 de agosto, que aprovou o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, nos termos do qual «[c]onstituem poderes dos deputados: (…) [r]equerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade de normas nos termos constitucionais».
Segundo os requerentes, as referidas normas, na parte em que estabelecem a composição dos órgãos de direção, administração e gestão da Escola Profissional Dr. Francisco Fernandes, integrada no Instituto para a Qualificação, IP-RAM, são ilegais, por violação do artigo 48.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, na parte em que estabelece que a administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino se orientam por princípios de democraticidade e de participação de todos os implicados no processo educativo (n.º 2), que, na administração e gestão desses estabelecimentos, devem prevalecer critérios de natureza pedagógica e científica sobre critérios de natureza administrativa (n.º 3) e que a direção de cada estabelecimento é assegurada por órgãos próprios, para os quais são democraticamente eleitos os representantes de professores, alunos e pessoal não docente (n.º 4).
2. A alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição da República Portuguesa atribui a um décimo dos deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas o poder de requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade, com força obrigatória geral, «quando o pedido de declaração de inconstitucionalidade se fundar em violação dos direitos das regiões autónomas ou o pedido de declaração de ilegalidade se fundar em violação do respetivo estatuto».
O requerimento encontra-se subscrito por dez deputados à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, número que excede um décimo dos quarenta e sete deputados àquela Assembleia, o que permite, quanto ao número de deputados, dar por preenchido o requisito de legitimidade.
Contudo, a legitimidade dos requerentes para requerer a fiscalização da legalidade ao Tribunal Constitucional está ainda limitada quanto ao fundamento do pedido: como este Tribunal tem reiteradamente afirmado, ao contrário do que sucede com o poder de iniciativa atribuído aos órgãos elencados nas outras alíneas do n.º 2 do artigo 281.º, aquele que é conferido às entidades mencionadas na alínea g) circunscreve-se aos casos em que o pedido de declaração de ilegalidade se funda em violação do Estatuto Político-Administrativo da respetiva Região Autónoma.
Ora, no presente pedido, os requerentes suscitam a ilegalidade das normas citadas dos referidos decreto legislativo regional e portarias regionais com fundamento em violação da Lei de Bases do Sistema Educativo. Alegam os requerentes que esta Lei de Bases constitui lei de valor reforçado, pela razão de que «pode constituir um ‘pressuposto normativo necessário’ para as normas do DLR n.º 6/2016/M e sua portaria de regulamentação ou, se assim não se entender, constitui uma lei ‘que por outras deva[m] ser respeitada[s]’», e concluem que, em virtude da «relação de prevalência dos princípios e normas da LBSE sobre as normas indicadas do DLR n.º 6/2016/M e da portaria que regulamentou este», estas normas são ilegais.
A eventual violação, por parte das normas sindicadas, da Lei de Bases do Sistema Educativo, independentemente do seu valor reforçado, não integra a causa de ilegalidade de cuja suscitação depende a legitimidade dos deputados da Assembleia Legislativa para pedir a fiscalização da legalidade. Não se fundando o pedido de declaração de ilegalidade numa violação do Estatuto da Região Autónoma, verifica-se não estar preenchido o requisito de legitimidade previsto na parte final da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição.
É certo que os requerentes invocam, para basear o pedido, o disposto na alínea h) do n.º 1 do artigo 22.º da Lei n.º 130/99, de 21 de agosto, que aprovou o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira, nos termos do qual os deputados à Assembleia Legislativa têm o poder de requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade de normas. No n.º 2 do mesmo artigo explicita-se que este poder «só pode ser exercido, no mínimo, por um décimo dos deputados», não se referindo outras limitações à legitimidade. Porém, não se pode daqui inferir que o Estatuto está a conferir aos deputados uma legitimidade mais ampla do que a que resulta da alínea g) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição. Aliás, a citada alínea h) do n.º 1 do artigo 22.º do Estatuto, apesar de não explicitar todos os requisitos de legitimidade constitucionalmente exigidos, não deixa de sujeitar o poder nela elencado aos «termos constitucionais».
Nos termos do n.º 1 do artigo 52.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, o pedido de fiscalização abstrata não deve ser admitido quando formulado por pessoa ou entidade sem legitimidade. Em face do exposto, o Tribunal decide, ao abrigo do disposto no artigo 52.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, não admitir o pedido.
Lisboa, 27 de Junho de 2016 - Fernando Vaz Ventura - Pedro Machete - João Cura Mariano - Lino Rodrigues Ribeiro - Catarina Sarmento e Castro - João Pedro Caupers - Carlos Fernandes Cadilha - Ana Guerra Martins - Maria Lúcia Amaral - Teles Pereira - Maria José Rangel de Mesquita - Joaquim de Sousa Ribeiro (fonte: Tribunal Constitucional)

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