O PS-Madeira está hoje
em directas para o congresso regional que marcará o partido, dado que a
liderança que vier a ser eleita abrangerá as regionais de 2019, no fundo o
objectivo político de qualquer partido, quer se trate de conquista do poder, de
sobrevivência "in extremis" pura e simples ou de uma mera
continuidade na mesma pasmaceira em que alguns vivem e sobrevivem desde 1976.
Estas eleições
internas no PS-Madeira mais do que um fenómeno a merecer a atenção dos politólogos
e dos estudantes de qualquer cadeira de ciência política universitária -
sobretudo por causa das estranhas especificidades subjacentes - mostram que no
PS-regional, mais do que uma discussão entre projectos há sim uma luta pelo
poder. De grupos, não de pessoas. E mais nada. É do poder que falamos.
Vou tentar desenvolver
três aspetos que considero importantes, na minha óptica, numa análise ao que se
passa, reafirmando que se trata da minha opinião pessoal - apenas eu respondo
por ela - apesar dela poder conquistar outras concordâncias:
- os erros políticos e
pessoais de Carlos Pereira (CP), a sua postura pessoal na política e uma
agressividade que esconde uma espécie de continuada vingança pessoal contra
tudo e contra todos os que se movem alegadamente contra ele;
- o deslumbramento de
CP pelo poder em Lisboa, e pelo protagonismo mediático sobre o qual construiu a
sua imagem política e conseguiu chegar à liderança de um PS-Madeira reduzido a
cacos depois do fracasso nas regionais de 2015, permitindo-se uma ausência
semanal acentuada da RAM numa altura em que o partido eventualmente já se
movimentava nos bastidores para a solução agora concretizada;
- a ambição de poder
de uma determinada estrutura ligada ao PS funchalense (que tem Cafofo como
referência)
- as ligações do que
se passa no PS-Madeira com a disputa pela liderança quer no Bloco (Paulino
Ascensão contra Roberto Almada) quer eventualmente no CDS (José Manuel
Rodrigues contra Rui Barreto).
Ao contrário do que as
pessoas pensam, está tudo ligado entre si, nada acontece por acaso. Comecemos
pelos últimos itens.
A confirmada
candidatura do deputado Paulino Ascensão (PA) ao Bloco de Esquerda,
aparentemente deslumbrado com o que aconteceu nas legislativas de 2015 que
deram ao BE um resultado nunca antes alcançado e irrepetível - dado que não
passou de um episódio como a seu tempo constataremos - parece indiciar que, tal
como acontece com o PS e CP, há a mãozinha de Lisboa nesta decisão bloquista.
Aliás, lembro que foi o deputado Trancoso, ex-presidente da AM do Funchal, o
primeiro a surgir na praça pública afrontando criticamente PA, deixado a
postura de "paninhos quentes" que tem marcado o comportamento de
Roberto Almada face a este "dossier".
Desconfio que
Ascensão, por estar deslumbrado com o poder, com os corredores em Lisboa, com o
mediatismo que o estatuto (com o qual nunca contou) lhe propicia na televisão e
nos demais média, esquece que foi com Roberto Almada - independentemente dos
factores externos que justificaram esse resultado - que o Bloco conseguiu na
Madeira o resultado que teve nas regionais de 2015, passando de ausente do
parlamento em 2011 a grupo parlamentar na assembleia regional e conquistando
pela primeira vez um lugar na Assembleia da República a reboque de uma
episódica onda eleitoral que favoreceu o Bloco num determinado momento e
contexto.
Ascensão justifica a
sua candidatura por entender que o BE devia estar a beneficiar mais na RAM do
mediatismo do partido a nível nacional. Um mediatismo que ele sabe (mas
esconde) que se foi esmorecendo desde 2015 o que leva Catarina e seus pupilos e
pupilas a uma postura de descarado oportunismo saloio, colando-se a tudo o que
é manifestação, greves, confusão, reivindicação, etc. Tentando esconder que é
parceiro da governação nacional da geringonça liderada pelo PS.
Ascensão esquece dois
pormenores: nas autárquicas, apesar do Bloco não ser um partido autárquico por
natureza, os resultados na Madeira foram desastrosos, o mesmo acontecendo com o
BE a nível nacional já que não conquistou uma câmara municipal que fosse. Esse
desfecho eleitoral, apesar da diferença entre as eleições, começou a preocupar
sectores do BE que entendem que alguma coisa tem que ser feita sob pena do
partido chegar a 2019 sem espaço de manobra e sem que ninguém lhe reconheça
qualquer utilidade, já que é o PS a chamar a si os loucos de uma governação que
dizem ser de sucesso mas que tanto PCP como o BE contestam na praça pública
(mas apoiam no parlamento).
Paulino, que é quadro
da CMF, poderia ser a solução pretendida por Lisboa para o Bloco-versão 2019, o
que implica que tenha que conquistar um partido que julgo estar claramente ao
lado de Roberto Almada. No caso da disputa eleitoral, os propósitos de Ascensão
estarão relacionados com um projecto de geringonça à moda da Madeira - caso
Emanuel Câmara seja eleito líder do PS - que é olhado com algum distanciamento
calculista por Almada/Trancoso (por se tratar de regionais) mas que PA poderá
ser adepto mais entusiástico e, portanto, mais consentâneo com o que seriam os
desejos de Cafofo. Isso pouparia o Bloco a qualquer tripla humilhação eleitoral
em 2019 (europeias, regionais e legislativas).
Temo que PA venha a
sofrer uma enorme humilhação política neste seu projecto de conquistar a
liderança do Bloco por tudo o que essa candidatura pode significar de
envolvimento (e apadrinhamento) externo nesses propósitos e estratégia. Julgo
mesmo que PA terá dificuldades em reunir apoios suficientes para formalizar a
sua própria candidatura. O tempo dirá se tenho ou não razão.
Quanto ao CDS a
questão é simples: depois do que se passou, de absurdo e quase patético, no
congresso regional de 2015 - devido à demissão de José Manuel Rodrigues após
dois resultados eleitorais pouco estimulantes - e das hesitações e polémicas
que entretanto se foram registando, parece haver no CDS uma tendência, em
organização, que aparentemente será forte, que defende o regresso de JMR, na
perspectiva das regionais de 2019.
Embora este regresso
não surpreenda, ele fica mais natural de atendemos a que JMR tem uma conhecida
aversão crónica a qualquer entendimento com o PSD, ao mesmo tempo que foi,
enquanto vereador eleito na CMF, e apesar de ter concorrido separadamente, um
aliado decisivo no primerio mandato de Cafofo na CMF com o qual, diz-se nos
corredores do poder regional e nos seus informados bastidores políticos, terá
construído uma amizade pessoal. Ora com JMR na lideraça do CDS o projecto
político de Cafofo ganharia ali um potencial aliado, quer antes, quer depois
das eleições regionais de 2109.
Chegamos finalmente ao
PS-Madeira e aos dois primeiros itens desta minha apreciação.
Dizem alguns amigos e
comentaristas que CP já perdeu não porque Emanuel Câmara - cuja legitimidade
para se candidatar não se discute, acrescida do facto de estar no PS há muito
mais tempo que CP - tenha mais apoios no partido, substancialmente superiores,
não por causa do que é consubstanciado pela sua candidatura em relação a Paulo
Cafofo, mas porque os "cafofistas" do Funchal terão garantido o
controlo de estruturas socialistas, aproveitando a ausência de CP em Lisboa
onde julgava que lhe dariam alguma coisa.
Regressado
apresessadamente ao Funchal, quando percebeu que alguma coisa se estaria a
passar e que não tinha afinal o partido na mão - será que alguma vez o teve
mesmo? - CP tenta tudo para manter-se na liderança dos socialistas. Falhadas as
tentativas de antecipação do Congresso, mesmo antes das autárquicas, CP deveria
ter percebido então, mas não foi capaz disso, que alguma coisa se estaria a
passar nos bastidores e que dificilmente ele deixaria de ter que enfrentar
Cafofo, independentemente de ganhar ou não a CMF. Uma vitória esmagadora, como
veio a acontecer, acabou por abrir caminho ao "independente"
socialista (não filiado) e autarca funchalense que precisou apenas de uma
estrutura operacional que foi sendo montada a passos por elementos do PS,
muitos dos quais antes estiveram com CP.
Quais os outros erros de
CP?
Distanciamento no
terreno face às estruturas socialistas locais, permitindo que esse fosso fosse
ocupado por projetos de poder como veio a acontecer, polémica com o processo
das autárquicas e algumas opções discutíveis nas autárquicas (o PS
perdeu o Porto Santo e ganhou Ponta do Sol, surpreendentemente, e limitou-se a
manter Porto Moniz e Machico) não conquistando mais nada do que isso a não ser
votações irrelevantes em vários municípios, casos de Câmara de Lobos, Santa
Cruz, Calheta e São Vicente.
Acresce a tudo isso, à
ausência em Lisboa e ao processo autárquico que não deu nada de útil ao PS - os
resultados dos socialistas nas legislativas nacionais de 2015 não foram mérito
de CP nem do PS local mas uma consequência positiva do sentimento existente ao
nível da política nacional e do desgaste que a coligação PSD-CDS inegavelmente
evidenciava, e como se verificou, apesar de surpreendentemente ter ganho as
eleições com mais votos - há a destacar ainda uma agressividade pessoal
demasiado irritante e pouco favorável, uma evidente falta de empatia com as
pessoas que vulnerabilizaram logo o lugar de líder conquistado sobre um PS-M
reduzido a cacos depois do fracasso das regionais de 2015, um discurso político
marcado por uma agressividade que esconde uma espécie de ajuste de contas
contra tudo e contra todos os que se movem contra ele, um percurso político
algo inconstante já que não deixa de ser, na lógica partidária, um cristão novo
no PS onde surgiu por motivos que todos conhecemos - Emanuel Câmara em
declarações na RTP-M fez alusão a isso de forma contundente e crítica.
CP cometeu outro erro
no processo de constituição da lista de candidatos do PS-M à Assembleia da
República colocando apenas pessoas da sua confiança pessoal nos primeiros
lugares, afastando, por exemplo, Bernardo Trindade que era tido como candidato.
De uma forma subtil -
já mais descaradamente assumida em certos ambientes - aceitou o confronto
com Cafofo e a sua "entourage"
provavelmente porque percebeu que tinha toda a razão de ser a teoria de que se
ganhasse a CMF, o autarca seria candidato à liderança do partido e do governo
regional. O que falhou neste quadro, porque Cafofo é um socialista
"independente" (sem filiação) foi a estratégia protagonizada por
Emanuel Câmara, situação que acabou por colocar problemas acrescidos a CP,
sobretudo depois de EC ter ganho o Porto Moniz de forma brilhante conquistando
a maioria absoluta e todas as juntas de freguesia do concelho.
Fragilizado
internamente, distante das pessoas externamente, beneficiando apenas de algum
protagonismo mediático (particularmente em espaços de debate na RTP-Madeira),
para o qual viveu e continua a viver - e fico-me por aqui relativamente a
outras intenções mais recentes... - CP parte para esta corrida eleitoral
interna fragilizada.
Mas não acredito que CP esteja já vencido.
Sempre defendi que,
independentemente da dimensão da estrutura socialista do Funchal, que
previsivelmente se dividirá entre os dois nomes com provável vantagem para
Cafofo, CP conta com Machico e Câmara de Lobos para travar EC. A dúvida reside
em saber se o apoio pessoal de Franco e de Amândio a CP é pessoal e é seguido
pelas estruturas dirigentes intermédias em cada concelho e pelas bases
militantes. Se isso acontecer, EC poderá enfrentar dificuldades, porque ainda
não percebi bem a dimensão militante do PS em Santa Cruz e continuo sem
entender para que lado joga o PS do
Porto Santo, embora admita que Cafofo pode ter conquistado recentemente
algum espaço nestes dois concelhos.
Portanto, ao contrário
do que alguns prognosticam, acho bem que as pessoas esperem pelos resultados
finais e que a Comissão Eleitoral ao contrário do que, por exemplo, o PSD
nacional fez recentemente em relação a um processo semelhante, divulgue pelo
menos os resultados eleitorais nos diferentes concelhos da RAM.
Finalmente - e apesar
de tudo ter feito para ser uma espécie de porta-voz, por tudo e por nada, do
governo socialista de Costa, mesmo quando nada era resolvido de útil para a
RAM, não se furtando a papeis absolutamente ridículos e contraditórios - é um
facto que CP, apesar de nunca o ter referido publicamente - apoiantes seus
fizeram-no - percebeu que provavelmente a estrutura dirigente do PS nacional
teria sido convencida pelo projecto de EC evolvendo Cafofo e que Costa terá
dado luz verde a essa solução, algo que, no entanto, ninguém assume e pode
provar (LFM)
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