sexta-feira, janeiro 19, 2018

PS-Madeira em directas: a tempestade facílima de entender...

O PS-Madeira está hoje em directas para o congresso regional que marcará o partido, dado que a liderança que vier a ser eleita abrangerá as regionais de 2019, no fundo o objectivo político de qualquer partido, quer se trate de conquista do poder, de sobrevivência "in extremis" pura e simples ou de uma mera continuidade na mesma pasmaceira em que alguns vivem e sobrevivem desde 1976.
Estas eleições internas no PS-Madeira mais do que um fenómeno a merecer a atenção dos politólogos e dos estudantes de qualquer cadeira de ciência política universitária - sobretudo por causa das estranhas especificidades subjacentes - mostram que no PS-regional, mais do que uma discussão entre projectos há sim uma luta pelo poder. De grupos, não de pessoas. E mais nada. É do poder que falamos.
Vou tentar desenvolver três aspetos que considero importantes, na minha óptica, numa análise ao que se passa, reafirmando que se trata da minha opinião pessoal - apenas eu respondo por ela - apesar dela poder conquistar outras concordâncias:
- os erros políticos e pessoais de Carlos Pereira (CP), a sua postura pessoal na política e uma agressividade que esconde uma espécie de continuada vingança pessoal contra tudo e contra todos os que se movem alegadamente contra ele;
- o deslumbramento de CP pelo poder em Lisboa, e pelo protagonismo mediático sobre o qual construiu a sua imagem política e conseguiu chegar à liderança de um PS-Madeira reduzido a cacos depois do fracasso nas regionais de 2015, permitindo-se uma ausência semanal acentuada da RAM numa altura em que o partido eventualmente já se movimentava nos bastidores para a solução agora concretizada;
- a ambição de poder de uma determinada estrutura ligada ao PS funchalense (que tem Cafofo como referência)
- as ligações do que se passa no PS-Madeira com a disputa pela liderança quer no Bloco (Paulino Ascensão contra Roberto Almada) quer eventualmente no CDS (José Manuel Rodrigues contra Rui Barreto).
Ao contrário do que as pessoas pensam, está tudo ligado entre si, nada acontece por acaso. Comecemos pelos últimos itens.
A confirmada candidatura do deputado Paulino Ascensão (PA) ao Bloco de Esquerda, aparentemente deslumbrado com o que aconteceu nas legislativas de 2015 que deram ao BE um resultado nunca antes alcançado e irrepetível - dado que não passou de um episódio como a seu tempo constataremos - parece indiciar que, tal como acontece com o PS e CP, há a mãozinha de Lisboa nesta decisão bloquista. Aliás, lembro que foi o deputado Trancoso, ex-presidente da AM do Funchal, o primeiro a surgir na praça pública afrontando criticamente PA, deixado a postura de "paninhos quentes" que tem marcado o comportamento de Roberto Almada face a este "dossier".
Desconfio que Ascensão, por estar deslumbrado com o poder, com os corredores em Lisboa, com o mediatismo que o estatuto (com o qual nunca contou) lhe propicia na televisão e nos demais média, esquece que foi com Roberto Almada - independentemente dos factores externos que justificaram esse resultado - que o Bloco conseguiu na Madeira o resultado que teve nas regionais de 2015, passando de ausente do parlamento em 2011 a grupo parlamentar na assembleia regional e conquistando pela primeira vez um lugar na Assembleia da República a reboque de uma episódica onda eleitoral que favoreceu o Bloco num determinado momento e contexto.
Ascensão justifica a sua candidatura por entender que o BE devia estar a beneficiar mais na RAM do mediatismo do partido a nível nacional. Um mediatismo que ele sabe (mas esconde) que se foi esmorecendo desde 2015 o que leva Catarina e seus pupilos e pupilas a uma postura de descarado oportunismo saloio, colando-se a tudo o que é manifestação, greves, confusão, reivindicação, etc. Tentando esconder que é parceiro da governação nacional da geringonça liderada pelo PS.
Ascensão esquece dois pormenores: nas autárquicas, apesar do Bloco não ser um partido autárquico por natureza, os resultados na Madeira foram desastrosos, o mesmo acontecendo com o BE a nível nacional já que não conquistou uma câmara municipal que fosse. Esse desfecho eleitoral, apesar da diferença entre as eleições, começou a preocupar sectores do BE que entendem que alguma coisa tem que ser feita sob pena do partido chegar a 2019 sem espaço de manobra e sem que ninguém lhe reconheça qualquer utilidade, já que é o PS a chamar a si os loucos de uma governação que dizem ser de sucesso mas que tanto PCP como o BE contestam na praça pública (mas apoiam no parlamento).
Paulino, que é quadro da CMF, poderia ser a solução pretendida por Lisboa para o Bloco-versão 2019, o que implica que tenha que conquistar um partido que julgo estar claramente ao lado de Roberto Almada. No caso da disputa eleitoral, os propósitos de Ascensão estarão relacionados com um projecto de geringonça à moda da Madeira - caso Emanuel Câmara seja eleito líder do PS - que é olhado com algum distanciamento calculista por Almada/Trancoso (por se tratar de regionais) mas que PA poderá ser adepto mais entusiástico e, portanto, mais consentâneo com o que seriam os desejos de Cafofo. Isso pouparia o Bloco a qualquer tripla humilhação eleitoral em 2019 (europeias, regionais e legislativas).
Temo que PA venha a sofrer uma enorme humilhação política neste seu projecto de conquistar a liderança do Bloco por tudo o que essa candidatura pode significar de envolvimento (e apadrinhamento) externo nesses propósitos e estratégia. Julgo mesmo que PA terá dificuldades em reunir apoios suficientes para formalizar a sua própria candidatura. O tempo dirá se tenho ou não razão.
Quanto ao CDS a questão é simples: depois do que se passou, de absurdo e quase patético, no congresso regional de 2015 - devido à demissão de José Manuel Rodrigues após dois resultados eleitorais pouco estimulantes - e das hesitações e polémicas que entretanto se foram registando, parece haver no CDS uma tendência, em organização, que aparentemente será forte, que defende o regresso de JMR, na perspectiva das regionais de 2019.
Embora este regresso não surpreenda, ele fica mais natural de atendemos a que JMR tem uma conhecida aversão crónica a qualquer entendimento com o PSD, ao mesmo tempo que foi, enquanto vereador eleito na CMF, e apesar de ter concorrido separadamente, um aliado decisivo no primerio mandato de Cafofo na CMF com o qual, diz-se nos corredores do poder regional e nos seus informados bastidores políticos, terá construído uma amizade pessoal. Ora com JMR na lideraça do CDS o projecto político de Cafofo ganharia ali um potencial aliado, quer antes, quer depois das eleições regionais de 2109.
Chegamos finalmente ao PS-Madeira e aos dois primeiros itens desta minha apreciação.
Dizem alguns amigos e comentaristas que CP já perdeu não porque Emanuel Câmara - cuja legitimidade para se candidatar não se discute, acrescida do facto de estar no PS há muito mais tempo que CP - tenha mais apoios no partido, substancialmente superiores, não por causa do que é consubstanciado pela sua candidatura em relação a Paulo Cafofo, mas porque os "cafofistas" do Funchal terão garantido o controlo de estruturas socialistas, aproveitando a ausência de CP em Lisboa onde julgava que lhe dariam alguma coisa.
Regressado apresessadamente ao Funchal, quando percebeu que alguma coisa se estaria a passar e que não tinha afinal o partido na mão - será que alguma vez o teve mesmo? - CP tenta tudo para manter-se na liderança dos socialistas. Falhadas as tentativas de antecipação do Congresso, mesmo antes das autárquicas, CP deveria ter percebido então, mas não foi capaz disso, que alguma coisa se estaria a passar nos bastidores e que dificilmente ele deixaria de ter que enfrentar Cafofo, independentemente de ganhar ou não a CMF. Uma vitória esmagadora, como veio a acontecer, acabou por abrir caminho ao "independente" socialista (não filiado) e autarca funchalense que precisou apenas de uma estrutura operacional que foi sendo montada a passos por elementos do PS, muitos dos quais antes estiveram com CP.
Quais os outros erros de CP?
Distanciamento no terreno face às estruturas socialistas locais, permitindo que esse fosso fosse ocupado por projetos de poder como veio a acontecer, polémica com o processo das autárquicas e algumas opções discutíveis nas autárquicas  (o PS perdeu o Porto Santo e ganhou Ponta do Sol, surpreendentemente, e limitou-se a manter Porto Moniz e Machico) não conquistando mais nada do que isso a não ser votações irrelevantes em vários municípios, casos de Câmara de Lobos, Santa Cruz, Calheta e São Vicente.
Acresce a tudo isso, à ausência em Lisboa e ao processo autárquico que não deu nada de útil ao PS - os resultados dos socialistas nas legislativas nacionais de 2015 não foram mérito de CP nem do PS local mas uma consequência positiva do sentimento existente ao nível da política nacional e do desgaste que a coligação PSD-CDS inegavelmente evidenciava, e como se verificou, apesar de surpreendentemente ter ganho as eleições com mais votos - há a destacar ainda uma agressividade pessoal demasiado irritante e pouco favorável, uma evidente falta de empatia com as pessoas que vulnerabilizaram logo o lugar de líder conquistado sobre um PS-M reduzido a cacos depois do fracasso das regionais de 2015, um discurso político marcado por uma agressividade que esconde uma espécie de ajuste de contas contra tudo e contra todos os que se movem contra ele, um percurso político algo inconstante já que não deixa de ser, na lógica partidária, um cristão novo no PS onde surgiu por motivos que todos conhecemos - Emanuel Câmara em declarações na RTP-M fez alusão a isso de forma contundente e crítica.
CP cometeu outro erro no processo de constituição da lista de candidatos do PS-M à Assembleia da República colocando apenas pessoas da sua confiança pessoal nos primeiros lugares, afastando, por exemplo, Bernardo Trindade que era tido como candidato.
De uma forma subtil - já mais descaradamente assumida em certos ambientes - aceitou o confronto com  Cafofo e a sua "entourage" provavelmente porque percebeu que tinha toda a razão de ser a teoria de que se ganhasse a CMF, o autarca seria candidato à liderança do partido e do governo regional. O que falhou neste quadro, porque Cafofo é um socialista "independente" (sem filiação) foi a estratégia protagonizada por Emanuel Câmara, situação que acabou por colocar problemas acrescidos a CP, sobretudo depois de EC ter ganho o Porto Moniz de forma brilhante conquistando a maioria absoluta e todas as juntas de freguesia do concelho.
Fragilizado internamente, distante das pessoas externamente, beneficiando apenas de algum protagonismo mediático (particularmente em espaços de debate na RTP-Madeira), para o qual viveu e continua a viver - e fico-me por aqui relativamente a outras intenções mais recentes... - CP parte para esta corrida eleitoral interna fragilizada.
Mas não acredito que CP esteja já vencido.
Sempre defendi que, independentemente da dimensão da estrutura socialista do Funchal, que previsivelmente se dividirá entre os dois nomes com provável vantagem para Cafofo, CP conta com Machico e Câmara de Lobos para travar EC. A dúvida reside em saber se o apoio pessoal de Franco e de Amândio a CP é pessoal e é seguido pelas estruturas dirigentes intermédias em cada concelho e pelas bases militantes. Se isso acontecer, EC poderá enfrentar dificuldades, porque ainda não percebi bem a dimensão militante do PS em Santa Cruz e continuo sem entender para que lado joga o PS do  Porto Santo, embora admita que Cafofo pode ter conquistado recentemente algum espaço nestes dois concelhos.
Portanto, ao contrário do que alguns prognosticam, acho bem que as pessoas esperem pelos resultados finais e que a Comissão Eleitoral ao contrário do que, por exemplo, o PSD nacional fez recentemente em relação a um processo semelhante, divulgue pelo menos os resultados eleitorais nos diferentes concelhos da RAM.

Finalmente - e apesar de tudo ter feito para ser uma espécie de porta-voz, por tudo e por nada, do governo socialista de Costa, mesmo quando nada era resolvido de útil para a RAM, não se furtando a papeis absolutamente ridículos e contraditórios - é um facto que CP, apesar de nunca o ter referido publicamente - apoiantes seus fizeram-no - percebeu que provavelmente a estrutura dirigente do PS nacional teria sido convencida pelo projecto de EC evolvendo Cafofo e que Costa terá dado luz verde a essa solução, algo que, no entanto, ninguém assume e pode provar (LFM)

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