A Comissária europeia
Corina Cretu promete estar atenta às intenções do governo português em desviar
fundos comunitários das regiões mais pobres. Em risco estão milhões que
servirão para pagar investimentos como o Metro de Lisboa ou para despesas
correntes como a ação social escolar. É mais uma acha na fogueira que é a
guerra aberta que estalou entre o governo e o principal partido da oposição em
torno da reprogramação dos milhões de fundos comunitários que ainda sobram do
atual quadro comunitário 2014/2020, o Portugal 2020.
Enquanto o Governo
está a ultimar a proposta de reprogramação a submeter a Bruxelas, o
eurodeputado social-democrata José Manuel Fernandes – que é o coordenador para
a área orçamental do maior grupo político do Parlamento Europeu (PPE) –
pressionou a Comissão Europeia a tomar uma primeira posição sobre a legalidade
de várias intenções já anunciadas pelo Governo português.
Em causa estão
mexidas nos fundos comunitários, que têm sido alvo de forte contestação dos
autarcas, sobretudo da região Norte, que já admitiram fazer queixa do Governo
português a Bruxelas por ser um “Robin dos Bosques ao contrário”. É o caso do
desvio de fundos das regiões mais pobres do país para pagar as obras nos
metropolitanos de Lisboa e Porto e na linha ferroviária de Cascais. E é também
o caso do desvio de fundos da gaveta do Fundo Europeu do Desenvolvimento
Regional (FEDER) para o Fundo Social Europeu (FSE), de modo a pôr os fundos do
Portugal 2020 destinados às regiões mais pobres a pagar gastos que deviam caber
ao Orçamento do Estado, designadamente despesas com a ação social escolar ou
cursos e estágios profissionais.
TRÊS LINHAS VERMELHAS
Questionada sobre
qual é a posição da Comissão Europeia relativamente ao desvio de montantes financeiros
destinados às regiões menos desenvolvidas (como o Norte) para a região mais
desenvolvida (Lisboa), a comissária europeia responsável pelos fundos
comunitários da política regional, a romena Corina Cretu, respondeu ao
eurodeputado português “que o quadro financeiro plurianual 2014-2020 predefiniu
dotações para fundos e categorias de regiões - menos desenvolvidas, mais
desenvolvidas e em transição -, de acordo com critérios específicos” e que
“devem ser respeitadas regras estritas no que diz respeito à transferência de
fundos entre os referidos fundos e as categorias de regiões”.
Questionada sobre se
a Comissão Europeia concorda com a transferência de montantes financeiros do
Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) para o Fundo Social Europeu
(FSE) com o objetivo de se financiarem despesas correntes que deveriam ser
assumidas pelo Orçamento do Estado português, a Corina Cretu respondeu ao
eurodeputado “que ainda não recebeu qualquer pedido de transferência entre os
fundos, mas que, de qualquer modo, não é possível utilizar o financiamento da
União Europeia para cobrir apenas as despesas correntes do orçamento de um
Estado-Membro”.
Questionada sobre se
a Comissão Europeia concorda que se retirem montantes financeiros geridos pela
Instituição Financeira de Desenvolvimento, e destinados à criação de
instrumentos financeiros, para serem utilizados como subvenções e destinadas à
região mais desenvolvida (Lisboa), a comissária europeia recordou “que ainda
não recebeu qualquer pedido para a retirada do apoio cujo pagamento está
previsto através dos instrumentos financeiros, com o objetivo de conceder
subvenções em alternativa a esse apoio”. Mas acrescenta: “Em todo o caso, e tal
como exige o quadro regulamentar, a utilização prevista dos instrumentos
financeiros através dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento deve ter
em consideração a avaliação ex ante que foi realizada em Portugal no início
deste período de programação. Além disso, o Plano de Investimento para a Europa
prevê que os Estados-membros se comprometam a duplicar a utilização dos
instrumentos financeiros durante o período de 2014-2020, em comparação com o
período de programação anterior”.
Sobre a proposta para
a reprogramação do Portugal 2020 que o Governo português está agora a ultimar
para submeter à Comissão Europeia, a comissária acrescenta que o ministro
português do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, esteve a 20 de
março em Bruxelas para apresentar a opinião geral da sua administração
relativamente à reprogramação do Portugal 2020. “Logo que as autoridades
portuguesas finalizem o pedido, o mesmo será devidamente avaliado pela
Comissão.”
GOVERNO ESPERA LUZ
VERDE
Sem o aval de
Bruxelas, o atual governo PS não poderá alterar significativamente o chamado “acordo
de parceria” que o anterior Governo PSD/CDS negociou com a Comissão Europeia em
2014, por forma a reforçar algumas gavetas de fundos comunitários em detrimento
de outras. O Governo tem-se afirmado descansado após os encontros que teve a 20
de março, quer com o comissário português Carlos Moedas, quer com a comissária
Corina Cretu em Bruxelas. “Saiu daqui não só um apoio de carácter genérico ao
trabalho desenvolvido até agora, mas o desafio mútuo de termos este processo
concluído até junho ou julho”, disse o ministro do Planeamento após a reunião
com a comissária em que anunciou o propósito de a reprogramação do Portugal
2020 contemplar “mais competitividade, mais qualificações, em particular de
adultos e do ensino profissional, bem como a descarbonização dos transportes e
o apoio aos metros, ao sistema de mobilidade do Mondego e à linha de Cascais”. Contudo,
para o eurodeputado social-democrata José Manuel Fernandes, as respostas
recebidas esta semana da própria comissária Corina Cretu demonstram que as
negociações com Bruxelas não serão assim tão fáceis quanto o Governo deixa
transparecer.
“Espero que a
Comissão se mantenha firme nos critérios, respeite o que escreveu na resposta e
não permita o desvio das regiões mais pobres, como o Norte, o Centro ou o
Alentejo. Espero que o Governo entenda, de uma vez por todas, que os fundos
europeus são para acrescentar valor e não podem ser usados para pagar despesas
correntes “, diz José Manuel Fernandes ao Expresso (Expresso)
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