sábado, maio 12, 2018

Europa: Bruxelas traça três linhas vermelhas à reprogramação do Portugal 2020

A Comissária europeia Corina Cretu promete estar atenta às intenções do governo português em desviar fundos comunitários das regiões mais pobres. Em risco estão milhões que servirão para pagar investimentos como o Metro de Lisboa ou para despesas correntes como a ação social escolar. É mais uma acha na fogueira que é a guerra aberta que estalou entre o governo e o principal partido da oposição em torno da reprogramação dos milhões de fundos comunitários que ainda sobram do atual quadro comunitário 2014/2020, o Portugal 2020.
Enquanto o Governo está a ultimar a proposta de reprogramação a submeter a Bruxelas, o eurodeputado social-democrata José Manuel Fernandes – que é o coordenador para a área orçamental do maior grupo político do Parlamento Europeu (PPE) – pressionou a Comissão Europeia a tomar uma primeira posição sobre a legalidade de várias intenções já anunciadas pelo Governo português.

Em causa estão mexidas nos fundos comunitários, que têm sido alvo de forte contestação dos autarcas, sobretudo da região Norte, que já admitiram fazer queixa do Governo português a Bruxelas por ser um “Robin dos Bosques ao contrário”. É o caso do desvio de fundos das regiões mais pobres do país para pagar as obras nos metropolitanos de Lisboa e Porto e na linha ferroviária de Cascais. E é também o caso do desvio de fundos da gaveta do Fundo Europeu do Desenvolvimento Regional (FEDER) para o Fundo Social Europeu (FSE), de modo a pôr os fundos do Portugal 2020 destinados às regiões mais pobres a pagar gastos que deviam caber ao Orçamento do Estado, designadamente despesas com a ação social escolar ou cursos e estágios profissionais.
TRÊS LINHAS VERMELHAS
Questionada sobre qual é a posição da Comissão Europeia relativamente ao desvio de montantes financeiros destinados às regiões menos desenvolvidas (como o Norte) para a região mais desenvolvida (Lisboa), a comissária europeia responsável pelos fundos comunitários da política regional, a romena Corina Cretu, respondeu ao eurodeputado português “que o quadro financeiro plurianual 2014-2020 predefiniu dotações para fundos e categorias de regiões - menos desenvolvidas, mais desenvolvidas e em transição -, de acordo com critérios específicos” e que “devem ser respeitadas regras estritas no que diz respeito à transferência de fundos entre os referidos fundos e as categorias de regiões”.
Questionada sobre se a Comissão Europeia concorda com a transferência de montantes financeiros do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) para o Fundo Social Europeu (FSE) com o objetivo de se financiarem despesas correntes que deveriam ser assumidas pelo Orçamento do Estado português, a Corina Cretu respondeu ao eurodeputado “que ainda não recebeu qualquer pedido de transferência entre os fundos, mas que, de qualquer modo, não é possível utilizar o financiamento da União Europeia para cobrir apenas as despesas correntes do orçamento de um Estado-Membro”.
Questionada sobre se a Comissão Europeia concorda que se retirem montantes financeiros geridos pela Instituição Financeira de Desenvolvimento, e destinados à criação de instrumentos financeiros, para serem utilizados como subvenções e destinadas à região mais desenvolvida (Lisboa), a comissária europeia recordou “que ainda não recebeu qualquer pedido para a retirada do apoio cujo pagamento está previsto através dos instrumentos financeiros, com o objetivo de conceder subvenções em alternativa a esse apoio”. Mas acrescenta: “Em todo o caso, e tal como exige o quadro regulamentar, a utilização prevista dos instrumentos financeiros através dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento deve ter em consideração a avaliação ex ante que foi realizada em Portugal no início deste período de programação. Além disso, o Plano de Investimento para a Europa prevê que os Estados-membros se comprometam a duplicar a utilização dos instrumentos financeiros durante o período de 2014-2020, em comparação com o período de programação anterior”.
Sobre a proposta para a reprogramação do Portugal 2020 que o Governo português está agora a ultimar para submeter à Comissão Europeia, a comissária acrescenta que o ministro português do Planeamento e das Infraestruturas, Pedro Marques, esteve a 20 de março em Bruxelas para apresentar a opinião geral da sua administração relativamente à reprogramação do Portugal 2020. “Logo que as autoridades portuguesas finalizem o pedido, o mesmo será devidamente avaliado pela Comissão.”
GOVERNO ESPERA LUZ VERDE
Sem o aval de Bruxelas, o atual governo PS não poderá alterar significativamente o chamado “acordo de parceria” que o anterior Governo PSD/CDS negociou com a Comissão Europeia em 2014, por forma a reforçar algumas gavetas de fundos comunitários em detrimento de outras. O Governo tem-se afirmado descansado após os encontros que teve a 20 de março, quer com o comissário português Carlos Moedas, quer com a comissária Corina Cretu em Bruxelas. “Saiu daqui não só um apoio de carácter genérico ao trabalho desenvolvido até agora, mas o desafio mútuo de termos este processo concluído até junho ou julho”, disse o ministro do Planeamento após a reunião com a comissária em que anunciou o propósito de a reprogramação do Portugal 2020 contemplar “mais competitividade, mais qualificações, em particular de adultos e do ensino profissional, bem como a descarbonização dos transportes e o apoio aos metros, ao sistema de mobilidade do Mondego e à linha de Cascais”. Contudo, para o eurodeputado social-democrata José Manuel Fernandes, as respostas recebidas esta semana da própria comissária Corina Cretu demonstram que as negociações com Bruxelas não serão assim tão fáceis quanto o Governo deixa transparecer.

“Espero que a Comissão se mantenha firme nos critérios, respeite o que escreveu na resposta e não permita o desvio das regiões mais pobres, como o Norte, o Centro ou o Alentejo. Espero que o Governo entenda, de uma vez por todas, que os fundos europeus são para acrescentar valor e não podem ser usados para pagar despesas correntes “, diz José Manuel Fernandes ao Expresso (Expresso)

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