segunda-feira, julho 23, 2018

As contradições da democracia portuguesa, os partidos diabolizados e a banca “lavadinha”


A democracia portuguesa tem destas coisas. Sabe-se que o nível de agastamento popular relativamente a qualquer fato em concreto, depende da amplitude noticiosa que os média propiciam ao tema e da sistemática repetição informativa que o mesmo é objecto. Dou-vos um exemplo que em situações normais qualquer um consideraria ser revelador da hipocrisia mas idiota que por aí anda, muitas vezes trasvestida ou de “justiceiros” do regime ou “moralizadores” da política.
Há dias ficamos a saber que:

- os partidos políticos, que considero peças essenciais de qualquer democracia, apesar dos seus defeitos e virtudes, devem cerca de 50 milhões de euros, particularmente à banca;
- que só em 2017 o Estado gastou mais de 800 milhões de euros com bancos falidos;
- que o Estado paga mais a ex-directores do falido BPN (que nos custou já mais de 10 mil milhões de euros), contratados por uma espécie de empresa pública, do que ao Presidente da República (dois antigos responsáveis do núcleo duro de José Oliveira Costa, do BPN, recebem todos os meses um salário mensal em torno dos 12.600 euros, mais 5.900 euros do que aufere o Presidente da República, conclusão retirada da auditoria da Inspecção-Geral das Finanças (IGF) à Parvalorem, empresa pública que ainda gere cerca de 3.000 milhões de euros de activos tóxicos do antigo Banco Português de Negócios (BPN).

O que aconteceu? Imediatamente as redes sociais albergaram, como é habitual, os moralistas da treta do costume, que acham que os partidos não devem ser financiados pelo Estado. Por um lado exigem isso, mas por outro criticam os partidos por dependerem de apoios privados ou alegadamente serem perigosamente financiados por grupos económicos (claro que sobre isto “ladram” os paridos que não valem rigorosamente nada, que não são nem nunca serão partidos de poder que não têm qualquer peso social e político digno de algum destaque e que, se outros não dizem por vergonha, eu digo-o claramente, não fazem falta nenhuma ao sistema partidário nacional).
 Sempre disse, escrevi e reafirmo: prefiro que o Estado financie os partidos em valores razoáveis, como acontece (e sempre aconteceu) do que ter partidos marionetes de grupos económicos ou dirigentes de partidos que, por causa disso, não passam de sopeiros de interesses e grupos económicos, sopeirismo esse que ninguém detecta (veja-se o que se passa com o ex-ministro Manuel Pinho e o antigo grupo BES, caso que eu desconfio que ainda vai dar muito que falar, depois de investigado pela justiça, e vai mostrar muita podridão em muitos patamares da política portuguesa, incluindo alguns que reclamam uma “castidade” que dá vontade de rir).
Ainda recentemente ficamos a saber que o Estado já meteu nos bancos, sem retorno, mais de 9 mil milhões de euros pagos não pelos vizinhos do lado mas por todos nós. É sabido que cerca de 15 a 18 mil dos 90 milhões de euros que nos foram emprestados pela troika na crise de 2011 (e que com juros e comissões nos custarão mais de 115 mil milhões de euros) foram consignados exclusivamente bancos, porque o sistema financeiro nessa altura estava a cair de podre e as falências dos bancos era uma ameaça real que foi sustida pelo menos na dimensão que inicialmente todos temiam. Estamos a falar de milhares de milhões de euros pagos pelos portugueses…
O que é curioso é que, quanto a isso as mesmas redes sociais remetem-se ao silêncio criminoso e patético, ninguém vê nenhuma irritação popular e os próprios média viram a cara para o lado dedicando pouca atenção e pouco espaço ao tema, até porque os interesses publicitários - e não só - envolvendo a banca são enormes, a que se juntam passivos que ficam adormecidos com o beneplácito das instituições de crédito que obviamente reagiriam de outra forma se este tema fosse colocado todos os dias na agenda mediática.
É mais fácil, de facto muito mais fácil falar dos partidos, atacar os partidos, criticar a dúvida dos partidos, do que falar num sector - a banca – que é um covil sem fundo de gastos, de patifarias de corrupção, de compadrios com a política, de esquemas mafiosos que nem a justiça consegue desvendar com a celeridade que todos desejavam.
Por isso, quando sou confrontado com as críticas aos partidos, acho que apenas uma das duas hipóteses se colocam: ou são pessoas que sabem que quanto mais fracos e dependentes os partidos – que devem obedecer a regras financeiras claras e não se transformar numa bandalheira sem rei nem roque, apesar do aumento da fiscalização nos últimos anos - melhor porque a democracia e as instituições democráticas ficam mais fragilizadas e desacreditadas, ou são apenas grupos de bisca transformados em partidozecos insignificantes, sem sede, sem dirigentes, sem militantes, sem organização, sem nada, que vivem em função eleitoralmente do espaço que ganham nos meios de comunicação social. Alguns de tão moralistas foram que até se esqueceram de formalizar obrigações legais que levaram à sua extinção pouco dignificante. Mas andaram anos a criticar outros, quais moralistas da treta. O costume. Outros desapareceram do mapa levados pelo vento do tempo e porque não fizeram falta a ninguém. É este o debate que realmente interessa e importa? O problema são os cerca de 50 milhões de euros que os principais partidos políticos devem, não esta patifaria associada à banca. Não me lixem por favor e mudem a trampa do disco que está gasto! (LFM)

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