Frequentemente
ouvimos dizer, tarefa a cargo de uma propaganda incompetente e já ridicularizada
em diversas ocasiões, que o país está melhor. Obviamente que em termos de
contas públicas o programa de ajustamento assinado por Sócrates com a troika e
aplicado entre 2011 e 2014, gerou resultados positivos mas muito distantes do
pretendido. Mau seria que assim não fosse, depois das patifarias cometidas nestes
quatro anos em nome da austeridade “salvadora” de um país que se limitou a
viver de cócoras perante os mercados, a banca, os “lobbies” financeiros e o
capitalismo europeu e mundial de uma maneira geral.
Contudo, já em
termos sociais e económicos, esse mesmo programa de ajustamento deixou marcas
profundas, expressas no aumento da pobreza, no aumento dos problemas nas famílias
e nas empresas, no roubo de pensões e reformas, no ataque aos rendimentos dos
trabalhadores, na liberalização dos despedimentos selvagens em nome da criação
de “emprego” (que na realidade não passa da institucionalização de uma abjeta
selvajaria exploradora de mão-de-obra), nas privatizações selvagens forçadas
para que eles amealhassem uns patacos com impacto no défice, à custa da venda do
país a retalho, na austeridade bandalha e acelerada, enfim, num conjunto de
procedimentos que nada tiveram a ver com a versão original do memorando de
entendimento assinado com a troika mas antes com caprichos e opções ideológicas
protofascistas do governo de coligação instalado no poder em Lisboa graças à mentira
na campanha eleitoral de 2011 e às habilidades e manipulação monumental a cargo
de grupos de pressão e de outros grupelhos instalados na sociedade portuguesa e
que atuam na sombra e nos esgotos da política, da finança e da economia. Mas
vivendo sempre do orçamento e do tráfego de influências e consequente
manipulação dos processos decisórios.
Em situações
normais o que se exigiria das pessoas, num ano duplamente eleitoral seria o
ajuste de contas com quem foi responsável, de facto, por tudo o que se passou
nos últimos quatro anos no nosso país. Mas isso é matéria que diz respeito à
liberdade, à consciência, à decisão dos cidadãos e à sua escolha, até porque os
que foram os principais causadores da falência do país contam agora com alegadas
vantagens decorrentes da memória curta do povo português, achando até que podem
ganhar eleições, quatro anos depois da falência do país que (des) governaram
durante seis anos com Sócrates à cabeça do pelotão.
Esta nossa
realidade social, económica e orçamental explica por que razão a OCDE reconheceu
o desacelerar da economia portuguesa, essencialmente porque dependemos de
fatores exógenos que não controlamos mas que nos afetam. Ou que a Comissão
Europeia tenha decidido manter-nos sob vigilância por mais um ano e que o
Eurogrupo tenha esta semana reconhecido que provavelmente serão necessárias
mais medidas de austeridade adicionais para que as metas do défice previstas
para 2015 se concretizem. Como estamos em ano eleitoral, toda a gente desmente
tal cenário que seria absolutamente fatal para a coligação de Passos Coelho e
do CDS. O problema é saber se até Setembro ou Outubro o governo de coligação
terá possibilidade de resistir a essa pressão da Europa e dos mercados.
Antes disso
estou convencido que a patifaria da governação - falo concretamente do
escandaloso agravamento do IMI, um roubo bem demonstrativo de como este governo
de coligação de hipócritas consegue os “sucessos” de que tanto se orgulha – será
confrontada com um inevitável aumento da contestação popular, sobretudo quando
os cidadãos começarem a ser notificados pelas Finanças e perceberem que a
esmagadora maioria deles pagará mais IMI em 2015, o que faz com que, num contexto
de dificuldades acrescidas, as ameaças de penhora das casas que tanto esforço
representaram nas poupanças e nos rendimentos de milhares de famílias, acabem
por ser uma inevitabilidade.
Não entendo
como é que perante todas estas patifarias em torno do IMI e que penalizam os
cidadãos, a corja de bandalhos no poder, que sabia perfeitamente o que iria
acontecer, não impediu que por causa do fim da clausula-travão no IMI possam registar-se
para muitas famílias aumentos dos valores daquele imposto da ordem dos 500%, apesar
da maioria delas ser obrigada a pagar em média, entre 30% e 40% a mais do que
pagaram no ano anterior.
Não acredito,
muito sinceramente, que perante uma situação desta gravidade, e quando as
famílias continuam a braços com uma queda abrupta de rendimentos, quando os desempregados
continuam a ser aos milhares, muito perto do milhão de pessoas (falo do desemprego
real, sem a manipulação e as aldrabices do poder, sempre que se trata de
aldrabar indicadores estatísticos incómodos), quando o aumento da pobreza,
confirmado pelo INE, é factual e não uma ficção, os portugueses fiquem calados
e de braços cruzados, incapazes de reagirem perante uma provocação do poder aos
cidadãos já demasiado martirizados pela austeridade que lhes foi imposta de uma
forma acelerada e cega.
É mais do que
evidente que não podemos aceitar a propaganda que insiste, só porque estamos em
vésperas de eleições, na ideia de que estamos todos bem. Não estamos coisa
nenhuma. Porventura estarão melhores do que estavam em 2011 as finanças
públicas, em termos do controlo da despesa pública, já que a dívida portuguesa
continua a roçar os 130% do PIB o que não deixa de ser estranho e escandaloso.
Quando ficamos
a saber, esta semana, que "há mais famílias e empresas sem conseguirem
pagar a tempo os empréstimos" o que faz com que o crédito em incumprimento
tenha voltado a aumentar em Janeiro, com o malparado a chegar aos 8,57% dos
empréstimos concedidos pelos bancos", percebemos logo a aldrabice. Segundo
o Banco de Portugal, dos 208.866 milhões de euros de empréstimos a particulares
e a empresas, 17.909 milhões de euros "são considerados créditos vencidos,
que deveriam ter sido pagos pelos clientes, mas que não foram amortizados
dentro do prazo". Repare-se que entre Dezembro de 2014 e Janeiro de 2015, "registou-se
um aumento do montante absoluto do crédito vencido (em 282 milhões de euros),
mas este não foi o único fator a contribuir para o agravamento do rácio do
incumprimento. O total dos empréstimos também encolheu, diminuindo a base de
crédito a partir da qual se calcula a percentagem de malparado". Contudo o
"incumprimento é mais elevado nos empréstimos empresariais, onde o rácio
do malparado abrange já perto de 15% de todo o crédito concedido: são 12.545
milhões de euros num total de 85.654 milhões de empréstimos, o correspondente a
14,65%. É o valor mais alto desde 1997, ano em que o banco central iniciou o
registo destes dados"
Há dias fomos
confrontados com a advertência do Eurogrupo de que Portugal poderá ter que
necessitar de mais medidas para atingir o compromisso do défice para este ano,
um objetivo ainda ao alcance mas cujo cumprimento não está assegurado.
Basicamente a Comissão Europeia "duvida que Portugal consiga colocar o
défice abaixo dos 3% do PIB, tal como se comprometeu" apesar de reconhecer
que o nosso país "está a fazer alguns progressos com as reformas
estruturais". A Comissão Europeia aponta para um défice de 3,2% do PIB,
quando Portugal anunciou um valor abaixo dos 3%, cenário que Bruxelas considera
que não será conseguido sem que sejam adotadas mas medidas de austeridade.
Todos
percebemos que, por estarmos em período eleitoral - talvez porque PSD e CDS,
apesar de empenhados em se manterem no poder, tentado ganhar mais-valias
eleitorais com a imagem de confusão e de fragilidade patenteada pelo PS de
Costa, ainda não formalizaram a coligação que alguns tanto desejam - a ministra
das Finanças, ao contrário do habitual, foi célere a contrariar as previsões do
Eurogrupo e a negar a necessidade de adoção de mais austeridade, apesar de ter
reconhecido que poderão ter que ser feitos ajustamentos, caso sejam
necessários, mas sem especificar quais e como.
Percebe-se esta
pressa da ministra: a meses de novas eleições, e com o IMI a prometer alguma
instabilidade social e contestação, o que faltava a esta coligação Passos-CDS
seriam mais medidas de austeridade que certamente serão tomadas depois das
eleições, caso a coligação seja a mais votada, por muito paradoxal e estranho
que isso possa parecer.
Mas estamos
realmente bem? Repito, as finanças públicas parece que sim, apesar de
continuarmos a braços com uma dívida estranhamente acima dos 130% do PIB. E as
pessoas? Obviamente que essas não estão melhores, pelo contrário. Os problemas
são mais que muitos, agravam-se, não se perspetivam soluções, há uma instabilidade
social motivada pelo medo de mais austeridade, pelo que é importante que nas
urnas os cidadãos pensem e decidam antes de fazerem as suas opções. Talvez por
causa esta nossa realidade, a Bloomberg, na elaboração do seu índice das
economias mais miseráveis tenha colocado Portugal na 10.ª posição de um
“ranking” de 51 países liderados pela Venezuela. O nosso país tem a 10.ª
economia mais miserável do 'ranking' da Bloomberg, numa lista que é obtida
somando, em cada país, a taxa de desemprego ao valor da inflação.
O
"vencedor" destacado desta competição é a Venezuela, que vive com uma
inflação galopante (64% pelo menos), desemprego em alta, escassez de bens de
primeira necessidade e perspetiva uma contração de 7% no PIB para este ano.
Argentina e África do Sul completam o pódio, ainda que com valores que não
chegam a metade do índice venezuelano. Ucrânia - um país em guerra e com o
desemprego a crescer -, Espanha, Rússia - a braços com uma crise quase sem
precedentes no valor do rublo -, Croácia e Turquia são os restantes países
colocados à frente de Portugal nesta lista. Com uma taxa de desemprego acima
dos 13% e a inflação que rondará, segundo o FMI, os 1,2% dificilmente Portugal
deixaria de figurar no "top 10" dos "miseráveis.
Melhores?
Obviamente que isso é treta. (LFM/JM)