“Parece que há uma tremenda confusão em torno da discussão sobre a
reforma do sistema político, que deve ser feita com naturalidade, com elevação
e com pragmatismo mas sem habilidades e oportunismos saloios à mistura. A questão
é política, ou seja, depende de opções políticas e das consequentes orientações
que os partidos darão aos respetivos deputados eleitos em devido tempo. O
Governo Regional não tem nada que se envolver no assunto – e isto nada tem a
ver com a possibilidade legítima e lógica do partido apoiante de um executivo
ter as suas propostas sobre esta temática - muito menos criar pastas na sua
orgânica para esse fim. Seria envolver-se numa matéria que é legislativa e
governamentalizar um assunto que é legislativo e parlamentar.
Há que acabar com esta ideia idiota de que sempre que se fala na
reforma do sistema político regional há uma espécie de "paizinhos" da
ideia, só porque falaram mais alto que outros em determinados momentos em
concreto. A reforma do sistema político visa melhorá-lo, dotá-lo de mais
eficácia, aproximá-lo mais das pessoas, garantir a funcionalidade das
instituições num quadro parlamentar de respeito pelos direitos de todos,
mormente das minorias, mas sem subverter a realidade política resultante de
expressão democrática e livre nas urnas e sem esquecer a proporcionalidade
política e parlamentar. A reforma do sistema político não pode virar trampolim
para protagonismos mediáticos oportunistas que apenas distorcem muitas vezes a
realidade partidária e geram conflitualidades internas que têm que ser
imediatamente neutralizadas, pela raiz, antes que se propaguem e contaminem.
Irrita-me esta teoria tonta, muitas vezes alimentada por fontes
facilmente identificáveis, de que a reforma do sistema político regional - que
tem que ser feita com equilíbrio e sem conflitualidades ou fundamentalismos
ignorantes - tem patronos. Não tem coisa nenhuma. Todos nós temos ideias sobre
o sistema político, no PSD regional e na oposição, na política e na sociedade
civil em geral. Não podemos tolerar, seja a que pretexto for, e insisto, a
obrigatoriedade de nos curvarmos perante alegados "donos" das ideias
subjacentes à reforma do nosso sistema político que só querem impor aos demais
um seguidismo com objetivos políticos futuros, também facilmente percetíveis.
Mudar o sistema político não se limita a alterar o regimento da
Assembleia, propor alterações ao Estatuto Político, mudar a lei eleitoral,
cortar nas subvenções públicas de apoio aos partidos, reduzir o número de
deputados ou elaborar um novo regime de incompatibilidades. Reformar o sistema
político tem a ver com a praxis política, com o discurso, com a dialética, com
a forma como os protagonistas da política a dignificam (ou não), com a
credibilidade pública que as pessoas conseguem na praça pública.
Por exemplo, não entendo por que razão a Madeira e Açores não se
entendem nas eleições para o Parlamento Europeu e a exemplo do que se passa na
Inglaterra, Bélgica ou Itália reclamam a criação de círculos eleitorais
próprios assentes num modelo a ser discutido? Preferem manter uma lista única
que é um espelho de negociatas políticas e não diz nada aos cidadãos? Preferem
continuar a ter eleições europeias que são vergonhosamente marcadas pela
abstenção só para que os partidos criem prateleiras douradas para alguns privilegiados
que rodam entre São Bento (Assembleia ou Governo) e Bruxelas, quais aves de
rapina? E se por acaso não fizerem (as direções nacionais dos principais
partidos) o favor de incluírem candidatos das duas Regiões Autónomas em
posições elegíveis em futuras candidaturas europeias? O que vão dizer os
políticos que agora passam ao lado desta proposta de mudança do sistema
eleitoral para o Parlamento Europeu vigente em Portugal?
Penso aliás, e a propósito, que Miguel Albuquerque devia retomar as
Cimeiras Madeira-Açores que durante anos se realizaram alternadamente nas duas
Regiões e que permitiam aios dois governos uma concertação de ideias, de
propostas e de estratégias em momentos-chave. Precisamos rapidamente de retomar
essa ideia, assumindo sem hesitações que se trata de uma iniciativa que deve
ser olhada de forma pragmática sem confundir o que não pode ser confundido.
Durante todos estes anos, vários foram os partidos da oposição
que no quadro das prerrogativas legislativas e parlamentares regionais,
apresentaram iniciativas a reclamar mudanças em vários dos diplomas que
constituem o alicerce do sistema político, propostas que não eram aceites.
Verdade é que mesmo a mudança da lei eleitoral regional, consumada em 2007,
acabou por agradar a alguns dos partidos da oposição, particularmente os que
acham que são penalizados pelos mais pequenos que agora arrebanham!
Deixemo-nos por isso de notícias especulativas e sem sentido. E
intoleráveis.
A Comissão Política do PSD da Madeira agora liderada por Miguel
Albuquerque tem várias propostas a serem implementadas no quadro da reforma do
sistema político. Propostas divulgadas desde as "diretas" no PSD
regional, salvo se continuarem alguns a vender a ideia de que essa matéria é
"propriedade" de uns tantos iluminados moralistas. Isto de querer dar
passos maiores do que as pernas pode ser fatal.
Há legislação que apesar de se aplicar à Madeira, e ao nosso sistema
político - e nem incluo a Constituição porque neste caso as coisas complicam-se
mais - e embora possa ser objeto de discussão e de propostas de alterações por
iniciativa dos deputados regionais, terá sempre que ser submetida a Lisboa e
apresentada como uma proposta à Assembleia da República a quem cabe a última
decisão nos termos constitucionais. Para que as pessoas percebam bem o que
quero dizer, nós não temos competência para aprovar uma nova lei eleitoral que
reduza os deputados regionais, nem para aprovar o nosso próprio Estatuto
Político. Podemos ter a iniciativa de propor a Lisboa alterações, mas a última
palavra cabe sempre ao plenário da assembleia da República.
Temos que admitir que, neste caso concreto e dados todos estes
condicionalismos legislativos, as coisas podem complicar-se, caso se verifique
em Lisboa, a ousadia de quererem impor-nos, mais alterações às iniciativas que
venham a ser presentes pelo parlamento regional. Politicamente tudo isto tem
que ser gerido com cautela. É importante ter presente a máxima popular de que
"Roma e Pavia não se fizeram num só dia". Acresce que muito do que se
possa referir, a propósito da reforma do sistema político regional - que deve
ser realizada - tem muito a ver com a realidade política e parlamentar também
no plano nacional e com a capacidade de diálogo e de negociação dos partidos
regionais, todos, junto das respectivas estruturas nacionais com representação
parlamentar em São Bento.
Bem vistas as coisas, quando o novo parlamento regional for eleito em
29 de Março, o que dirão os eleitores madeirenses à sua composição? Será assim
tão significativa a mudança de protagonistas? E quando os primeiros nomes da
lista de candidatos de alguns partidos forem chamados a outras funções ou, pura
e simplesmente, renunciarem e/ou suspenderem aos mandatos, dando lugar aos
candidatos imediatamente a seguir nos lugares inferiores das candidaturas, essa
renovação vai acentuar-se ou, paradoxalmente e pelo contrário, será mais do
mesmo aos olhos dos cidadãos, com protagonistas do passado recente, uns
recauchutados, outros não? Não será isto que, logo em primeira instância, é
realmente o que conta aos olhos dos cidadãos?!
Um primeiro indicador a reter, porque dará sinais muito concretos, tem
a ver com a abstenção. Em 2011 atingimos o valor mais alto de sempre em
regionais, pelo que esse item também está em cima da mesa nestas regionais em
tempos de mudança. Nada de precipitações. A legitimidade dos eleitos não é
posta em causa, sejam quais forem os resultados eleitorais em termos de
participação dos cidadãos. Mas a representatividade dos eleitores essa pode ser
facilmente questionável, por exemplo se se constatar que os deputados serão
eleitos por uma margem muito pequena de eleitores.
Dou-vos um exemplo concreto, tendo por base as regionais de 2011, da
incontestável legitimidade política dos eleitos:
- o deputado do MPT
no parlamento regional foi eleito com 2.839 votos correspondentes a 1,9% dos
votantes mas a 1,1% dos inscritos; o deputado do PAN foi eleito com 3.135
votos, 2,1% dos votantes e 1,2% dos inscritos; o deputado do PND foi eleito em
2011 com 4.825 votos, 3,3% dos votantes mas apenas 1,9% dos inscritos; o
deputado do PCP foi eleito com 5.546 votos, 3,7% dos votantes e 2,2% dos
inscritos; os 3 deputados do PTP foram eleitos com 10.112 votos, 6,9% dos
votantes e 3,9% dos inscritos; os 6 deputados do PS, eleitos com 16.945 votos,
representam 11,5% dos votantes e 6,6% dos inscritos; os 9 deputados do CDS,
eleitos com 25.974 votos (graças à perda de mais de 15 mil votos do PSD),
representam 17,6% dos votantes e 10,1% dos inscritos; os 25 deputados do PSD,
eleitos com 71.556 votos, representaram em 2011 48,6% dos votantes mas somente
27,9% dos inscritos.
Se alargarmos
esta análise em torno da legitimidade política “versus” representatividade
efetiva dos eleitos a outros itens, e considerando uma população de 261.313
pessoas (dados finais de 2013, os últimos divulgados pelo INE), constata-se
que:
- os votos do MPT representam 1,1% da população madeirense
(2013); os votos do PAN representam 1,2%, os do PND ficam-se pelos 1,9%, os do
PCP pelos 2,1%, os votos do PTP representam 3,9% da população regional, contra
6,5% dos votos do PS face à população da Madeira, 9,9% do CDS e 27,4% do PSD;
- ou seja, o PSD, partido mais votado nas regionais de 2011 com
48,6% dos votos, representa 27,9% dos eleitores inscritos (256.483) e 27,4% da
população madeirense. Já o maior partido da oposição, o CDS, obteve 17,6% dos
votos nas urnas, que significam 10,1% dos inscritos e 9,9% da população da
Região;
- fazendo uma média, conclui-se que cada deputado eleito pelo
PSD (25) correspondeu em 2011 a 2.862,24 votos, 2.886,00 votos por deputado no
caso do CDS, 2.824,17 no caso dos deputados do PS, 3.370,67 nos deputados do
PTP, 5.546 votos na eleição do deputado do PCP, 4.825 votos do PND, 3.135 votos
na eleição do deputado do PAN e 2.839 votos na eleição do deputado do MPT. Em
termos absolutos verifica-se que cada deputado eleito nas regionais de 2011
correspondeu a 5.457,08 dos eleitores inscritos, a 3.134,97 dos eleitores
votantes e a 5.559,85 cidadãos, considerando neste caso a população total da
região.
Repito e
insisto: quando se fala em reforma do sistema político regional, não me parece
que Miguel Albuquerque precise de uma "lanterna" para lhe dizer que
tipo de reformas devem ser feitas no quadro da modernização do sistema político
regional. Todos nós temos ideias próprias toldadas pela experiência política e
profissional. Com anos de experiência política que sobejam, incluindo uma
prolongada passagem na Assembleia Legislativa onde chegou a ser seu
Vice-Presidente, o novo líder do PSD regional sabe certamente o que é preciso
fazer, como deve ser feito e quando deve ser feito. Isto de precisar de
"guias" morais que só agora se agarraram a algumas bandeiras por
conveniências conjugadas, não faz sentido. Acabem por favor com isso de vez,
deixem-se de hipocrisias ou vaidades pessoais desmedidas, parem de passar
notícias aos jornalistas e aos blogues tentando conquistar mediatismo
desajustado - comportamento que revela também falta de lealdade - e ainda por
cima empolando estatutos que não correspondem à realidade. Que eu saiba o PSD
da Madeira tem um líder, um único líder, eleito pelos militantes numa votação
participada e democrática. Desconheço lideranças partilhadas talvez porque
reajo sempre com dificuldade à tentativa de quererem transformar a formiga em
elefante. A política tem muito disso.
Se lermos o
manifesto social-democrata - a ser distribuído nesta campanha eleitoral -
algumas das ideias no quadro da reforma do sistema político estão lá:
"honrar a Assembleia Legislativa da Madeira (e sobre isso falaremos
adiante) com a presença assídua do Governo, acabar com a acumulação da reforma
e dos vencimentos dos políticos no exercício de funções públicas, limitar a
três mandatos consecutivos a eleição do Presidente do Governo Regional,
reforçar o regime de incompatibilidades e reduzir o número de deputados".
Se recuarmos um pouco e recuperarmos a moção de Miguel Albuquerque apresentada
e votada pelo Congresso Regional, essas propostas estão claramente integradas
no documento.
Percebe-se por
aqui que há claramente uma aposta no papel da Assembleia Legislativa que
tenderá a ser, reforçadamente, o palco privilegiado para o debate político. Ou
seja, esta valorização do Parlamento reforça as obrigações dos futuros
deputados, precisando estes, cada vez mais, de dispor uma estrutura de apoio
que os credibilize e que constitua uma mais-valia para a sua atividade.
Transformar esta questão numa espécie de “quinta” pessoal usada para jogos de
pretensas influências internas, para selecionar amigalhaços ou para a promoção
de pessoas sem o mínimo conhecimento do papel de um parlamento e que acabam por
fazer tudo menos ajudar os deputados que carecem desse apoio de bastidores,
fundamental para os resultados da sua atividade, será errado. Ainda-por-cima
neste contexto. Acho que esta é uma questão em que deve ser o próprio líder do
PSD a chamar a si as decisões a tomar e a dar orientações claras" (LFM/JM)